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Trabalhador menor de idade e a contagem do tempo de contribuição previdenciária

Mariana Piroli Alves Sant'Anna Pinheiro
18/08/2020
Entenda como fica a situação previdenciária do trabalhador menor de idade com relação as contribuições previdenciárias.

O início da atividade laboral remunerada também significa o início da obrigação das contribuições à previdência social pelo indivíduo, o qual é denominado segurado obrigatório.

 

Já aquele que exerce ou não atividade laboral ou exerce atividade não remunerada, a partir dos 16 anos, pode optar por contribuir ou não com a previdência, portanto, é denominado segurado facultativo.

 

Com as diversas e constantes mudanças na legislação previdenciária, que geram a ansiedade dos contribuintes em programar suas aposentadorias, uma dúvida frequente é a respeito da idade que é possível iniciar essas contribuições para fins previdenciários e o que a legislação prevê a respeito.

 

O artigo 7º, XXXIII, da Constituição Federal, com a redação dada pela EC 20/98, prevê a “proibição de trabalhado noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos”.

 

Com a verificação da previsão legal, surgem novas dúvidas: E na prática, essas limitações legais são respeitadas? Como fica a proteção previdenciária àqueles que trabalharam fora dos limites etários impostos?

 

Ocorre que na prática, ao analisarmos a realidade do nosso país, nem sempre tais limitações são respeitadas. É sabido que muitos iniciam atividades laborais antes mesmo dos 14 anos. O maior índice de trabalho infantil é na zona rural e em famílias de baixa renda, que acabam por submeter os filhos menores ao trabalho vetado por lei, a fim de contribuírem na renda familiar, privando-os de uma infância plena.

 

Em relação às contribuições previdenciárias desses jovens, aqueles de 16 anos ou mais que exercerem atividade remunerada, são segurados obrigatórios e devem sim contribuir à previdência social e se não exercerem atividade laboral ou exercem de forma não remunerada, podem contribuir como segurados facultativos, sendo tal período contabilizado para fins previdenciários.

 

Já os jovens a partir de 14 anos, podem trabalhar como menores aprendizes, conforme preconiza o art. 428 da CLT e art. 7º, XXXIII da CF, ocasião em que também se tornam segurados obrigatórios e o seu tempo de contribuição também é contabilizado pela previdência.

Art. 428. Contrato de aprendizagem é o contrato de trabalho especial, ajustado por escrito e por prazo determinado, em que o empregador se compromete a assegurar ao maior de 14 (quatorze) e menor de 24 (vinte e quatro) anos inscrito em programa de aprendizagem formação técnico-profissional metódica, compatível com o seu desenvolvimento físico, moral e psicológico, e o aprendiz, a executar com zelo e diligência as tarefas necessárias a essa formação.

 

No entanto, para aqueles que exercem trabalho infantil, abaixo dos 14 anos, como fica a situação? O período trabalhado é contabilizado para fins previdenciários? Sim ou, ao menos, deveria.

 

Embora haja vedação ao trabalho infantil no Brasil, é fato que existem milhares de crianças desenvolvendo atividade laboral, inclusive no meio rural, portanto, é forçoso reconhecer a falha do estado em fiscalizar e inibir o trabalho infantil, no entanto, essa criança que já teve sua infância prejudicada em decorrência do trabalho, ao menos deverá ter garantida a proteção previdenciária.

 

Nos termos do art. 76 da IN n. 45/2010, o INSS já admitia a contagem de tempo de contribuição exercido com idade abaixo do limite legalmente permitido para o trabalho, a contar de 12 anos de idade, desde que comprovada a atividade mediante documento contemporâneo em nome do segurado. Ou seja, é possível verificar que houve uma flexibilização da idade mínima.

 

Contudo, em 2013, foi proposta Ação Civil Pública n. 5017267-34.2013.404.7100/RS, a qual teve parcial provimento, para que o INSS não exigisse comprovação de tempo de serviço/contribuição em idade inferior à mínima prevista no artigo 7º, XXXIII, da CF, através de meios probatórios mais restritos do que aqueles oportunizados nas demais situações, especialmente restringindo tal prova a documentos em nome do próprio menor e contemporâneos ao exercício da atividade.

 

Também, em 13 de maio de 2019, o INSS editou ofício circular n. 25 que possibilita o reconhecimento administrativo de trabalho (inclusive o rural) exercido em qualquer idade para fins previdenciários.

 

Em decorrência de determinações judiciais oriundas de ações civis públicas, o INSS ainda publicou a portaria conjunta n. 7/2020, cujas disposições serão aplicadas em todo o país aos benefícios com data de entrada do requerimento a partir de 19/10/18.

 

Com isso, aqueles segurados que tiveram seus requerimentos indeferidos em decorrência do não reconhecimento do tempo de contribuição nas condições acima mencionadas, seja por limitação de idade ou meios probatórios mais restritivos que em outros casos, deverão requerer junto ao INSS a revisão administrativa. Já nas demais situações anteriores a 19/10/18, restará ao segurado interpor ação judicial.

 

Importa mencionar que existem várias decisões do Superior Tribunal de Justiça que asseguram a contagem do tempo de contribuição para aqueles que desempenharam trabalho infantil, desde que a realidade fática seja devidamente comprovada, onde a criança, de fato, exerceu atividade laboral.

 

Deste modo, é possível concluir que, embora o trabalho infantil seja ilegal e deva ser duramente combatido, não considerar como tempo de contribuição para fins previdenciários esse período trabalhado, independente da idade, seria penalizar duplamente esse trabalhador, perdendo desta forma o sentido do princípio da universalidade da cobertura e do atendimento da seguridade social.

 

Assim, é de extrema importância que os segurados que trabalharam nessas condições, analisem a concessão ou indeferimento de seus requerimentos de benefícios previdenciários, a fim de verificar se houve a inclusão desse tempo de trabalho, o que pode refletir positivamente na concessão e no salário benefício.

 

Escrito por Mariana Piroli Alves Sant'Anna Pinheiro, Advogada, graduada pela UNIDERP, Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e Direito Previdenciário, ambas pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.

 

Referências

  1. BRASIL. [Constituição (1998)]. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>.

Acesso em: 12/08/2020.

  1. Consolidação das Leis do Trabalho. Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1º de maio de 1943. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>

Acesso em 12/08/2020.

  1.  Instituto Nacional do Seguro Social. Instrução Normativa n. 45/2010. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 6 de agosto de 2010.
  2. Instituto Nacional do Seguro Social, Ministério da Economia e Diretoria de Benefícios. Portaria Conjunta n. 7, de 9 de abril de 2020. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 14 de abril de 2020. Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-conjunta-n-7-de-9-de-abril-de-2020-252275418 .

Acesso em: 13/07/2020.

 

Mariana Piroli Alves Sant'Anna Pinheiro, Advogada, graduada pela UNIDERP, Pós-graduada em Direito e Processo do Trabalho e Direito Previdenciário, ambas pela Faculdade de Direito Professor Damásio de Jesus.