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STF: Lei dos planos de saúde só vale para contratos firmados depois de sua vigência

08/02/2018 - 10:23

Contratos relativos a planos de saúde celebrados antes de 4 de junho de 1998, quando passou a vigorar a lei 9.656/98, não são atingidos por regras nela estabelecidas. Assim entendeu o plenário do STF ao julgar nesta quarta-feira, 7, a ADIn 1.931, na qual a Confederação Nacional de Saúde questiona dispositivos da lei.


Por unanimidade, nos termos do voto do ministro Marco Aurélio, a Corte julgou parcialmente procedente o pedido da Confederação para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 10, § 2º, 35-E da lei, e art. 2ª da MP 2.177/01.


Julgamento


A ação teve medida cautelar deferida parcialmente pelo plenário do Supremo em 2003, quando então foi determinado que a referida lei não retroagiria sobre os contratos anteriores.


Posteriormente, foram apresentados embargos de declaração à decisão, e o Tribunal esclareceu que continuam a depender de prévia anuência da ANS os reajustes de contratos firmados a partir dessa norma, com redação dada pela MP 2.177/01, não devendo ser alcançados os contratos celebrados antes da edição da lei.


Inicialmente, foram feitas as sustentações orais tanto da defesa do impetrante quanto de Grace Mendonça, pela União. Em seguida, votou o relator, ministro Marco Aurélio. foram votados ponto a ponto os pedidos da ADIn.


Abrangência


Inicialmente, Marco Aurélio observou que, desde a propositura da ação, em 98, alguns preceitos impugnados sofreram uma série de alterações por leis posteriores. De modo que a ação foi julganda prejudicada em parte por perda superveniente de objeto. Os demais ministros acompanharam o relator neste ponto.


Passando à análise, o ministro tratou inicialmente dos artigos 10º, 11º e 12º, os quais tratam da abrangência e os limites de cobertura dos planos de assistência médica privada. Marco Aurélio observou que, pela lei, foram excluídos da cobertura tratamentos experimentais, medicamentos não nacionalizados, bem como os com finalidade estética, "evitando a imposição de ônus excessivo aos prestadores de serviço". Por outro lado, foram incluídos aspectos básicos de atendimento ambulatorial, hospitalar, obstétrico e odontológico, "sem os quais a prestação seria incompleta, onerando demasiadamente o consumidor".


Neste ponto, portanto, o ministro entendeu improcedente a articulação por desproporcionalidade, por falta de razoabilidade e de conflito dos referidos artigos com a CF, votando pela improcedência.


Idosos


Quanto ao art. 15, parágrafo único da lei dos planos, o qual dispõe sobre as variações de preços de acordo com a idade do consumidor, também foi alegada ofensa ao devido processo legal substantivo. O ministro observou que a norma inviabiliza a variação da contraprestação pecuniária relativamente a consumidores com mais de 60 anos, medida que “não é despropositada”. "Trata-se de regra protetiva aliada aos postulados constitucionais no que assegura tratamento digno a parcela vulnerável da população."


Também foi questionado o § 5ª do art. 19, de acordo com o qual as operadoras terão 180 dias para requerer autorização de funcionamento à ANS, mas que, independentemente do cumprimento das formalidades, os usuários de produtos contratados a partir de 2 de janeiro de 99 estão garantidos sobre o que foi disposto na lei e sua regulamentação. Para Marco Aurélio, a norma estabelece que, independentemente de impasses no registro administrativo, os consumidores não podem ser prejudicados.


Nestes dois pontos, também foi julgada improcedente a ação.


Ressarcimento ao SUS


Outro polêmico ponto discutido foi a necessidade de ressarcimento, pelas operadoras de saúde, ao SUS em caso de atendimento de pessoas detentoras de planos privados, se o tratamento estiver previsto no respectivo contrato. A regra está no art. 32 da referida lei. Para Marco Aurélio, o dispositivo é compatível com a CF.


Ele destacou que a regra não implica a criação de novas fontes de receitas para a seguridade, mas sim consiste em desdobramento da relação contratual entabulada em ambiente regulado. No entendimento do relator, o reembolso decorre de falha na execução da avença relativa ao plano de saúde, e não da necessidade de aumento das receitas da seguridade social. Daí se extrai não ter sido o ressarcimento instituído para custear a seguridade social, mas para recompor despesas públicas atribuídas aos atores privados.


"Se a atuação dos planos de saúde envolve o ressarcimento de hospitais e clinicas privados pela prestação de serviço de saúde, a gratuidade do Sistema Único de Saúde desobriga o reembolso? A resposta se mostra negativa."


Improcedente, portanto, o pedido de inconstitucionalidade do referido artigo.


Retroatividade


Por fim, o ponto central da discussão tratava da retroatividade da lei. De acordo com a ação, os artigos 10º, § 2º e 35 da lei 9.656/98 ofendem o ato jurídico perfeito e o direito adquirido.


Neste dispositivo, entendeu Marco Aurélio, a norma destoa do texto maior. “A vida democrática pressupõe segurança jurídica, e essa não se coaduna com o afastamento de ato jurídico perfeito mediante a aplicação de lei nova." Assim, entendeu impróprio inserir em relações contratuais anteriores disposições sequer previstas pelas partes quando da manifestação de vontade.


"A retroatividade determinada por esses preceitos faz incidir regra da legislação nova sobre cláusulas contratuais pré-existentes firmadas sob a égide do regime legal anterior, que a meu ver afrontam o direito consolidado das partes, de tal modo que violam o princípio consagrado no inciso 36 art. 5 da CF e põe-se em contraste com a jurisprudência desta Corte."


O relator concluiu que o legislador, com o intuito de potencializar a proteção ao consumidor, extrapolou as balizas da Carta Federal, pretendendo substituir-se a vontade dos já contratantes. 
Assim, entendeu por julgar parcialmente procedente a ação, para julgar inconstitucional a lei apenas nos pontos em que trata da retroatividade. Em todos os pontos, o ministro foi acompanhado à unanimidade.


Processo: ADIn 1.931




Fonte: Migalhas