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O impacto da reforma da previdência para os médicos

27/03/2019 - 15:00

Atualmente
a categoria profissional dos médicos tem direito a uma aposentadoria especial
em decorrência da exposição aos riscos biológicos e mesmo físicos (nos casos de
exposição a equipamentos de radiação). Entretanto, a proposta à Emenda da
Constituição nº 6/2019¹, pode trazer dias sombrios na vida desses profissionais
que dedicam-se a salvar vidas.


A
aposentadoria especial é um
benefício previdenciário de prestação continuada, que nasceu com a Lei nº
3.807, de 28 de agosto de 1960. Na procedência, sua avaliação juntava as
opiniões trabalhistas de insalubridade, periculosidade e penosidade, admitindo,
em resumo, duas suposições de concessão, à pela categoria profissional e pela
submissão a agentes nocivos².

Para entender o impacto da
reforma da previdência na aposentadoria especial do médico, recordemos como
funciona hoje esse tipo de aposentadoria.


APOSENTADORIA ESPECIAL DO MÉDICO HOJE


Tem
direito a aposentadoria especial todo profissional médico, seja na atividade
privada ou pública, que atender os seguintes requisitos, devidamente
comprovados:


-
exercer
a medicina por no mínimo 25 anos, independente de sua especialidade;


- não
tem idade mínima para aposentar;


Nessa
modalidade, não haverá a redução pelo fator previdenciário (criado em
28/11/1999, pela Lei 9.876)³, que pode diminuir a renda mensal inicial da
aposentadoria de forma extremamente desvantajosa.


O
valor da aposentadoria no RGPS será 100%, calculado sobre a média dos 80% dos
maiores salários que o médico recebeu exercendo a sua profissão (será excluído
20% das menores), somados e divididos pelos meses considerados.


Apesar
de algumas divergências jurisprudenciais, o entendimento majoritário é de que
os médicos servidores do RPPS (concursados) têm direito à integralidade na aposentadoria, ou seja, será concedido o valor
completo do último salário em atividade.


Uma
dúvida que sempre surge: pode o médico se aposentar e continuar exercendo a
profissão?

Para
responder essa pergunta teremos que analisar duas regras no ordenamento
jurídico pátrio. De um lado a Previdência Social, que proíbe a continuidade do
trabalho do médico na mesma atividade. De outro, temos a Constituição Federal
que interpretada pelo STF tem manifestado sobre a possibilidade do médico
continuar a exercer atividade médica, apesar da aposentadoria especial(4).


Portanto,
se o médico é aposentado pela categoria de especial e for proibido pelo INSS de
continuar a exercer sua profissão será necessário reverter tal situação no
Judiciário.


Um último tópico muito
importante na regra atual trata-se da possibilidade de conversão do tempo
especial em tempo comum. Quando o profissional quer juntar tempo comum exercido
em outras atividades, pode converter o tempo especial em comum para aposentar por
tempo de contribuição, ou seja, mais cedo. Para isso, aplica-se o multiplicador
de 1,20 (mulher) e 1,40 (homens) no tempo trabalhado nas atividades especiais e
soma o resultado da conversão ao tempo trabalhado em atividade comum.


APOSENTADORIA ESPECIAL PREVISTA NA PEC 06/19


A
PEC 06/19 terá grande impacto negativo na aposentadoria especial, vez que o
médico precisará combinar idade e tempo de contribuição para aposentar antes da
idade mínima exigida na regra geral e não terá direito a conversão de tempo
especial em comum.


Nessa
proposta de aposentadoria podemos vislumbrar diferentes cenários, com as
seguintes regras de transição (5):


- O
médico (homem ou mulher) que está em atividade laboral na data em que entrar em
vigor a lei terá direito a aposentadoria quando atingir 86 pontos e 25 anos de
contribuição, o que equivale dizer que será necessário ter no mínimo 61 anos de
idade.


- A
partir de janeiro de 2020, essa pontuação sofrerá um acréscimo de 1 ponto a
cada ano, ou seja, a soma da idade e do tempo de contribuição (homem e mulher)
deverá corresponder a 99 pontos.


- O
profissional que não atingir a soma da idade com o tempo de contribuição no
período de 5 anos após a publicação da Emenda, terá a sua aposentadoria
concedida pela média aritmética simples das contribuições. E o mais tenebroso:
haverá incidência do fator previdenciário sobre essa média.


O médico que adentrar na
atividade profissional
após a publicação da Emenda estará sujeito à regra permanente. Assim, para ter direito à aposentadoria
especial terá que cumprir dois requisitos, quais sejam, a idade de 60 anos e 25
anos de contribuição.


Ademais,
essa nova regra implicará em mudança drástica no valor do benefício que deixará
de ser integral, passando a ser considerado apenas o valor de 60% da média
salarial + 2% para cada ano além dos 20 anos de contribuição na atividade
especial. A partir de janeiro de 2020 essa pontuação será acrescida de 1 ponto
nos casos em que houver aumento de 6 meses na expectativa de vida do brasileiro
aos 65 anos de idade (6/7).


Outra
desvantagem da nova regra é que vai
acabar com a possibilidade de
converter
o tempo especial em tempo comum para os profissionais que iniciarem no mercado
após a reforma
, prática muito comum que agiliza a chegada da aposentadoria
em alguns casos.


CONCLUSÃO


Atualmente,
o número de médicos no Brasil é de aproximadamente 450 mil (8) e, apesar de
representar uma parcela muito pequena da sociedade brasileira, são
profissionais de alta relevância para a sociedade, reconhecida pela legislação
em vigor com a possibilidade da aposentadoria especial, com redução de tempo
trabalhado e recebimento de valor integral.


Infelizmente,
a PEC 06/19 atuará como um tsunami na aposentadoria especial do médico
destruindo a proteção legal arduamente conquistada ao longo de anos.


Embora
a proposta ainda esteja tramitando, é importante que profissionais da categoria
estejam atentos às possibilidades de mudanças, em especial aqueles que já se
encontram próximos do momento de se aposentar, fazendo um levantamento de sua
situação junto ao INSS e planejando com cuidado os próximos passos antes de dar
entrada na aposentadoria. Afinal, é preciso garantir o futuro de quem cuida da
saúde da população.


Bibliografia


1- 
Proposta à Emenda a
Constituição nº 6/2019.  - https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=4EAEF11F5334B6B5EECFF9278514874B.proposicoesWebExterno1?codteor=1712459&filename=PEC+6/2019

2- 
http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18823&revista_caderno=20

3- 
http://www.normaslegais.com.br/legislacao/trabalhista/lei9876.htmLei

4- 
https://koetzadvocacia.com.br/aposentadoria-especial-continuar-trabalhando/

5- 
https://www.ibdp.org.br/?p=

6- 
https://koetzadvocacia.com.br/aposentadoria-especial-do-medico-3/

7- 
https://ianvarella.jusbrasil.com.br/noticias/673174766/reforma-da-previdencia-aposentadoria-especial

8- 
https://www1.folha.uol.com.br/seminariosfolha/2018/04/numero-de-medicos-e-o-maior-da-historia-do-pais-mas-se-concentra-no-sudeste.shtml


Kátia Gomes, sócia fundadora do
escritório Gomes, Oliveira & Pinheiro. Vice coordenadora do Núcleo de
Direito Previdenciário do Instituto de Estudos Avançados em Direito.
Especialista em Direito Público. Ex coordenadora da prática previdenciária da
PUC-GO. email: katiagomes.adv@gmail.com.


Camilla Pinheiro, sócia proprietária do
escritório Gomes, Oliveira & Pinheiro. Membro do Núcleo de Direito
Previdenciário e coordenadora do Núcleo de Inovação e Gestão Jurídica do
Instituto de Estudos Avançados em Direito. Professora universitária. E-mail: camillapinheirocoach@gmail.com


Fonte: http://www.institutoead.org/