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INSS tem a obrigação de implantar o auxílio-acidente, quando lesões resultarem limitações para o trabalho 

03/02/2020 - 11:32


EMENTA


PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO INSS. 1) FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. NOVA ORIENTAÇÃO DO STF. PRESCINDIBILIDADE NA HIPÓTESE DOS AUTOS. PRECEDENTES. 2) MÉRITO. PERITO QUE CONSTATOU A REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE ATESTA A OCORRÊNCIA DE ACIDENTE EM 2007. AUXÍLIO-ACIDENTE DEVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 3) JUROS DE MORA NOS TERMOS DA LEI N. 11.960/2009 A PARTIR DA CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 870.947/SE) E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (TEMA N. 905). APELO DESPROVIDO. (TJ-SC - AC: 00002330920148240019 Concórdia 0000233-09.2014.8.24.0019, Relator: Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Data de Julgamento: 30/01/2020, Primeira Câmara de Direito Público)


Apelação Cível n. 0000233-09.2014.8.24.0019, de Concórdia


Relator: Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva


PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.


RECURSO DO INSS.


1) FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. NOVA ORIENTAÇÃO DO STF. PRESCINDIBILIDADE NA HIPÓTESE DOS AUTOS. PRECEDENTES.

2) MÉRITO. PERITO QUE CONSTATOU A REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. CONJUNTO PROBATÓRIO QUE ATESTA A OCORRÊNCIA DE ACIDENTE EM 2007. AUXÍLIO-ACIDENTE DEVIDO. SENTENÇA MANTIDA.

3) JUROS DE MORA NOS TERMOS DA LEI N. 11.960/2009 A PARTIR DA CITAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA PELO INPC. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (RE N. 870.947/SE) E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (TEMA N. 905). APELO DESPROVIDO.


Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0000233-09.2014.8.24.0019, da comarca de Concórdia 2ª Vara Cível em que é Apelante Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e Apelado Marlí Antônia Longo:


A Primeira Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade, negar provimento ao recurso e, de ofício, determinar a aplicação do INPC como índice de correção monetária. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Pedro Manoel Abreu e Luiz Fernando Boller (Presidente).


Florianópolis, 30 de janeiro de 2020.


Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva

Relator


RELATÓRIO


Marlí Antônia Longo propôs "ação de restabelecimento" em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.


Alegou que: 1) ficou incapacitada para as funções habituais em razão de doenças ocasionadas por acidente de trabalho e 2) o auxílio-doença foi indevidamente cessado pela autarquia.

Postulou o restabelecimento do beneficio e sua conversão em aposentadoria por invalidez ou a concessão de auxílio-acidente.


Em contestação, o réu sustentou que: 1) os requisitos para a concessão de benefício previdenciário não estão presentes e 2) o auxílio-acidente não pode ser concedido a segurado especial que não contribui facultativamente para a Previdência Social (f. 105/110).


Foi proferida sentença cuja conclusão é a seguinte:


Assim, ante o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, para condenar o Réu a conceder o benefício de auxílio-acidente a parte Autora, a contar de 31/07/2008.


O benefício deverá ser implantado no prazo de 30 (trinta) dias.


No período compreendido entre 17/01/2009 (prescrição quinquenal) até 30/06/2009, para fins de correção monetária, aplica-se o INPC.


Depois, tais valores serão corrigidos monetariamente, pelo IPCA-E, e juros de mora a partir da citação, conforme artigo 1º- F da Lei n. 9.494/1997.


Deixo de fixar os honorários advocatícios, na forma do artigo 85, § 4º, II, do Código de Processo Civil, haja vista que sendo ilíquida a sentença, a definição do percentual somente ocorrerá quando liquidado o julgado.


Consoante Lei Complementar Estadual n. 729/2018 que alterou o Regimento de Custas (LCE 156/1997) as autarquias federais são isentas do recolhimento de custas finais e despesas processuais. (f. 223/227)


O INSS, em apelação, sustentou que: 1) não há interesse processual em relação ao pedido de auxílio-acidente, ante a ausência de requerimento administrativo, 2) não ficou comprovada a redução da capacidade laborativa e 3) deve ser aplicada a TR como índice de correção monetária (f. 233/239).


Com as contrarrazões (f. 247/251), a d. Procuradoria-Geral de Justiça entendeu ausente o interesse ministerial (f. 259).


VOTO


1. Ausência de interesse


Caso praticamente idêntico já foi julgado por esta Câmara:


APELAÇÃO. AÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUXÍLIO-ACIDENTE. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. ART. 485, INC. I, DO NCPC. INSURGÊNCIA DO SEGURADO AUTOR. ALEGADA PRESCINDIBILIDADE DE NOVO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SUBSISTÊNCIA DA TESE. CESSAÇÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA SEM A OUTORGA DE OUTRO BENEFÍCIO. INDEFERIMENTO TÁCITO CONFIGURADO. MATÉRIA DE FATO JÁ LEVADA AO CONHECIMENTO DO INSS. DEVER DO ÓRGÃO ANCILAR EM CONCEDER A PRESTAÇÃO MAIS VANTAJOSA. INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO. RE Nº 631.240/MG. TEMA 350 DO STF. SENTENÇA CASSADA. IMEDIATO RETORNO DO FEITO À ORIGEM, PARA RETOMADA DO ITER PROCESSUAL. [...]. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (AC n. 0300952-61.2015.8.24.0057, de Santo Amaro da Imperatriz, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 3-4-2018)


Mudando-se o que deve ser mudado, a lide é igual.


Em resumo, nos dois casos:


- os autores recebiam auxílio-doença, que não foram convertidos para auxílio-acidente e

- buscam a concessão deste benefício.


Extrai-se do corpo do acórdão:


Em 03/09/2014 - quando do julgamento do Recurso Extraordinário n. 631.240/MG (Tema nº 350) -, o Supremo Tribunal Federal assentou o entendimento de que para postular em juízo a concessão de benefício previdenciário, deve o interessado primeiro pleitear a benesse administrativamente, não caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise.


No entanto, amoldou, também, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento da via administrativa, visto que tal condição não deve prevalecer quando a pretensão tratar de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, já que o instituto de seguro social tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento, ao menos tácito, da pretensão:


RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR.


1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo.


2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.


3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.


4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão.


5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos.


6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03/09/2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (I) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (II) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (III) as demais ações que não se enquadrem nos itens (I) e (II) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir.


7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir.


8. Em todos os casos acima - itens (I), (II) e (III) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais


9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. (RE nº 631240, Relator (a): Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral - Mérito DJe-220. Divulgado em 07/11/2014. Publicado em 10/11/2014 - grifei).


[...] Logo, "não há que se falar em ausência de interesse de agir, uma vez que a benesse percebida anteriormente (auxílio-doença) já inaugurou a relação entre o autor e a autarquia, sendo que o novo benefício supostamente devido é também consequência do infortúnio que gerou a concessão do auxílio-doença recebido" (Apelação Cível nº 0320540-43.2017.8.24.0038, de Joinville, rel. Des. Francisco Oliveira Neto, Segunda Câmara de Direito Público, j. 20/03/2018).


Ademais, se a autarquia federal de previdência condicionou o percebimento do auxílio-doença até determinada data (Alta Programada - fl. 13), é certo que já houve - ao menos em tese -, uma negativa implícita, configurando, portanto, o interesse de agir.


Além disso, conforme o disposto no art. 86, § 2º, da Lei nº 8.213/91, o órgão ancilar tem a obrigação legal de implantar o auxílio-acidente, quando, após a consolidação das lesões, resultarem limitações para o trabalho habitual:


[...] O auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria.


Ou seja, após a cessação do auxílio-doença, cabe ao INSS monitorar o estado de saúde do segurado e, caso constatada a redução da sua capacidade laboral, conceder-lhe, ou não, o benefício.


Adota-se o precedente como razão de decidir, porque há plena concordância com o entendimento, para garantir segurança jurídica e prestigiar a promessa constitucional da isonomia.


Além disso, como bem esclarecido nas contrarrazões e pelo perito judicial, a moléstia que acomete a autora é decorrente do mesmo acidente que ensejou a percepção de auxílio-doença no passado. Desse modo, trata-se de matéria de fato já levada ao conhecimento da autarquia.


Afasta-se, portanto, a tese de ausência de interesse.


2. Auxílio-acidente


Determina o art. 86 da Lei n. 8.213/1991:


Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem seqüelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.


A requerente exerce a função de agricultora (f. 5).


Os pontos mais relevantes da perícia são:


1) O Autor possui alguma enfermidade? Qual?

RESPOSTA: SIM. A Autora apresenta SEQUELAS TARDIAS DE PÓS-OPERATÓRIO DE MANGUITO ROTADOR DO OMBRO DIREITO + OSTEOFITOSE LOMBOSSACRA + DISCOPATIA + REDUÇÃO DOS ESPAÇOS DISCAIS (L3-L4 e L4-L5). A Autora apresenta dificuldade para elevar o braço Direito acima de 80º, isso compromete a realização de tarefas, tais como, segurar em cordas, cabos, enxada, foice, carregar baldes pesados, sacos de adubo, etc. Apresenta ainda, diminuição da força de membro superior direito, o que a torna incapaz para realizar algumas atividades que exigem maior esforço físico.


2) Qual a data de origem dessa enfermidade?

RESPOSTA: A enfermidade surgiu na data do acidente de trabalho no dia 08/04/2007.


3) Há nexo causal entre trabalho e a enfermidade? Justifique (acidente, exercício do trabalho, condição especial do trabalho ou outra causa).

RESPOSTA: SIM. Existe nexo causal entre o trabalho desempenhado e a enfermidade adquirida após uma queda sobre o braço direito, em que a Autora teve RUPTURA DOS TENDÕES QUE COMPÕE O MANGUITO ROTADOR DO OMBRO DIREITO. O acidente ocorreu em sua propriedade enquanto alimentava as vacas com bolsa de silagem com mais ou menos 20 a 30 Kg no dia 08/04/2008. Após alguns meses realizou a cirurgia, em que foi fixado um parafuso, no dia 21/01/2008 (SIP).


4) O autor apresenta incapacidade total para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência?

RESPOSTA: NÂO. A Autora apresenta INCAPACIDADE PARCIAL para desempenhar suas atividades que lhe garante a subsistência na agricultura.


5) Tal incapacidade é permanente ou temporária?

RESPOSTA: A INCAPACIDADE PARCIAL é PERMANENTE, pois se trata de sequelas de P.O. De Manguito rotador do Ombro Direito.


6) O autor apresenta incapacidade para seu trabalho ou atividade habitual?

RESPOSTA: SIM. A Autora apresenta INCAPACIDADE PARCIAL para desempenhar suas atividades de plantar, cultivar, colher grãos em geral, carregar bolsas com mais de 40/50 Kg de adubo ou grãos, manejar animais de grande porte em sua propriedade.


7) Tal incapacidade para seu trabalho ou atividade habitual é permanente ou temporária?

RESPOSTA: A INCAPACIDADE PARCIAL para seu trabalho na agricultura é PERMANENTE. (f. 187/194)


Como se vê, o expert constatou que a requerente está acometida de: 1) sequelas tardias relativas ao pós-operatório do manguito rotador do ombro direito; 2) osteofitose lombossacra; 3) discopatia e 4) redução dos espaços discais (l3-l4 e l4-l5).


Além disso, o perito considerou a autora parcialmente inapta para desenvolver o plantio, o cultivo e a colheita, bem como carregar pesos e cuidar de animais, exercícios inerentes à sua profissão.


Assim, ficou comprovada a redução da capacidade laborativa. E que não se diga que o grau da lesão interfere na concessão do benefício, pois:


"O fato da redução ser mínima, ou máxima, reafirmo, é irrelevante, pois a lei não faz referência ao grau da lesão, não figurando essa circunstância entre os pressupostos do direito, de modo que, para a concessão de auxílio-acidente, é necessário verificar, apenas, se existe lesão decorrente da atividade laboral e que acarrete, no fim das contas, incapacidade para o trabalho regularmente exercido. E não poderia ser de outro modo, pois como é sabido, a lesão, além de refletir diretamente na atividade laboral por demandar, ainda que mínimo, um maior esforço, extrapola o âmbito estreito do trabalho para repercutir em todas as demais áreas da vida do segurado, o que impõe a indenização" (STJ, REsp Representativo n. 1.109.591/SC, de relatoria do Min. Celso Limongi (Des. Convocado do TJ/SP), Terceira Seção, DJe de 08.09.2010). (EI n. 0018083-65.2016.8.24.0000, de Orleans, rel. Des. Ronei Danielli, Grupo de Câmaras de Direito Público, j. 11-5-2016)


Não obstante a existência de redução da capacidade laboral, a autarquia argumentou que não há, nos autos, prova cabal da ocorrência de acidente de trabalho.


A segurada apresentou diversos documentos médicos de data próxima ao momento que alega ter sofrido acidente (abril/2007, f. 76/84), apontando justamente as lesões no ombro constatadas pelo perito.


Há, portanto, indícios suficientes da ocorrência de acidente de trabalho. Eventual dúvida que possa existir deve ser resolvida em favor do obreiro, com a aplicação do princípio in dubio pro misero.

A propósito, ensina Tupinambá Miguel Castro do Nascimento:


Há certos princípios que acompanham o Direito Infortunístico de longa data. Entre eles, o in dubio pro misero. Através dele, considera-se a hipossuficiência do acidentado e, em casos duvidosos, manda-se pagar a indenização. As decisões neste sentido são remansosas. Todos os Tribunais do país têm-se orientado nesta direção. Note-se, em complemento, que a dúvida não se refere somente ao fato (ocorrência do acidente ou de doença do trabalho), mas também no que se refere ao próprio nexo etiológico e à incapacidade"(Curso de Direito Infortunístico. Porto Alegre: Fabris, 1983, p. 22 e 23)


Destaca-se que o fato de a autora continuar trabalhando não traz qualquer embaraço para a concessão do referido benefício, como se extrai do art. 86, § 3º, da Lei n. 8.213/1991:


§ 3º O recebimento de salário ou concessão de outro benefício, exceto de aposentadoria, observado o disposto no § 5º, não prejudicará a continuidade do recebimento do auxílio-acidente.


Assim, o INSS deverá implementar o auxílio-acidente em favor da segurada desde o dia seguinte à data da cessação do auxílio-doença, em 31-7-2008 (f. 54).


3. Juros de mora e correção monetária


Ao julgar o RE n. 870.947, o STF definiu, em relação ao art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009:


1) é inconstitucional na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública quanto a débitos oriundos de relação jurídico-tributária;


2) no que tange à atualização monetária é inconstitucional, pois inadequada a capturar a variação de preços da economia.


Para aquele caso concreto (que tratava de benefício de prestação continuada), a Corte determinou a incidência do IPCA-E.


No Tema n. 905 (REsp n. 1.492.221), o STJ reiterou que o mencionado dispositivo"não é aplicável nas condenações judiciais impostas à Fazenda Pública"e estabeleceu índices de correção de acordo com a natureza da demanda.


Como estabelece o art. 105 da Constituição Federal, cabe ao Superior Tribunal de Justiça uniformizar a aplicação do Direito Infraconstitucional e, consequentemente, a definição dos índices a serem aplicados a partir daquela declaração de inconstitucionalidade pelo STF.


Todavia, o Min. Luiz Fux, em 24-9-2018, deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos no RE n. 870.947 (CPC/2015, art. 1.026, § 1º), nos quais se postulava a modulação dos efeitos da decisão.


Sua Excelência destacou que:


[...] a imediata aplicação do decisum embargado pelas instâncias a quo, antes da apreciação por esta Suprema Corte do pleito de modulação dos efeitos da orientação estabelecida, pode realmente dar ensejo à realização de pagamento de consideráveis valores, em tese, a maior pela Fazenda Pública, ocasionando grave prejuízo às já combalidas finanças públicas.


Em decorrência disso, em 1-10-2018, o recurso extraordinário interposto no REsp n. 1.492.221 (Tema n. 905) foi sobrestado:


[...] Ante o exposto, com fundamento no art. 1.030, inciso III, do Código de Processo Civil, determino o sobrestamento do recurso extraordinário, e, com fulcro no art. 1.029, § 5º, inciso III, do CPC, atribuo-lhe efeito suspensivo até a publicação do acórdão a ser proferido pelo Supremo Tribunal Federal nos embargos de declaração opostos no RE 870.947/SE (Tema 810/STF).


Na sessão realizada em 3-10-2019, o STF rejeitou os aclaratórios, conforme se extrai da certidão do julgamento:


O Tribunal, por maioria, rejeitou todos os embargos de declaração e não modulou os efeitos da decisão anteriormente proferida, nos termos do voto do Ministro Alexandre de Moraes [...].


Por conta disso, no dia 8-10-2019, esta Câmara decidiu retornar ao entendimento estabelecido pelo STJ no Tema n. 905.


O magistrado singular deliberou nos seguintes termos, antes da publicação do acórdão do RE n. 870.947/SE:


No período compreendido entre 17/01/2009 (prescrição quinquenal) até 30/06/2009, para fins de correção monetária, aplica-se o INPC.


Depois, tais valores serão corrigidos monetariamente, pelo IPCA-E, e juros de mora a partir da citação, conforme artigo 1º- F da Lei n. 9.494/1997. (f. 226)


As Câmaras de Direito Público têm modificado o índice de correção monetária, de ofício, por entenderem que se trata de matéria de ordem pública e porque reconhecida a inconstitucionalidade do índice de correção da Lei n. 11.960/2009 pelo STF, o que não implica reformatio in pejus.

A respeito: 1) RN n. 0305415-80.2017.8.24.0023, da Capital, rel. Des. João Henrique Blasi, Segunda Câmara de Direito Público, j. 10-4-2018; 2) AC n. 0306398-45.2014.8.24.0036, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Ronei Danielli, Terceira Câmara de Direito Público, j. 22-5-2018; 3) AC n. 0009284-03.2012.8.24.0023, da Capital, rel. Des. Odson Cardoso Filho, Quarta Câmara de Direito Público, j. 19-4-2018 e 4) RN n. 0306824-37.2014.8.24.0075, de Tubarão, rel. Des. Denise de Souza Luiz Francoski, Quinta Câmara de Direito Público, j. 10-5-2018.


Esta Câmara passou a adotar o mesmo entendimento no julgamento da AC n. 0301116-37.2016.8.24.0042, sob a relatoria do Des. Luis Fernando Boller, j. 17-7-2018.


O caminho é reformar parcialmente a sentença, no ponto, para fazer prevalecer o que foi definido pelo STJ: a condenação sujeita-se à incidência do INPC para o período posterior à vigência da Lei n. 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei n. 8.213/1991.


Os juros de mora seguem a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei n. 9.494/1997, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).


4. Honorários recursais


A sentença foi publicada em 8-5-2019 (f. 228). Portanto, aplicável o CPC/2015.

Na inicial, a parte autora requereu restabelecimento do auxílio-doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez ou a concessão de auxílio-acidente.


Na sentença, o pedido foi julgado parcialmente procedente e a fixação dos honorários foi postergada para a etapa de liquidação.


O apelo foi desprovido, o que enseja a fixação de honorários recursais.


Quanto aos critérios dos incisos I a IV do § 2º do art. 85:


1) A matéria é singela. O trabalho e o tempo despendidos pelo advogado não foram excessivos;

2) O processo é eletrônico, sendo irrelevante a sede do escritório e

3) O trâmite da fase recursal, desde o protocolo da apelação até o presente julgamento, durou menos de 1 ano.


Nesse contexto, considerando-se cumulativamente os §§ 2º e 3º do art. 85, arbitram-se os honorários referentes à fase recursal, em favor do advogado da autora em 1% sobre o valor das parcelas vencidas (enunciado n. 111 da Súmula do STJ), que serão somados ao que será arbitrado em liquidação.


5. Conclusão


Nega-se provimento ao recurso e, de ofício, determina-se a aplicação do INPC como índice de correção monetária.


Honorários recursais na forma do item 3.


Gab. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva