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A importância da linguagem e comunicação jurídica para o advogado

26/02/2019 - 15:25

Há profunda relação entre o Direito e a linguagem. Impossível imaginar
um profissional da área jurídica sem domínio adequado do idioma tanto em sua
interpretação como em sua produção. Os atos normativos, os conhecimentos
doutrinários, as petições, os atos processuais, as decisões judiciais, tudo
passa pelo uso da linguagem. Todo o conhecimento e a realização do processo
jurídico passam pela linguagem.


1. CONCEITO E PROPÓSITO


O presente artigo aborda
um tema muito importante para qualquer pessoa que pretenda ingressar no mundo
jurídico. A área da linguagem e comunicação jurídica é pouco estudada por
operadores do direito, embora seja de extrema relevância. Neste artigo, são
apresentadas questões básicas a respeito da linguagem jurídica e de como se dá
a comunicação no meio jurídico, especialmente a realizada entre o advogado e
seu cliente na atualidade. É importante que haja entre o advogado e o cliente
uma compreensão de parte a parte, visto que é a partir deste primeiro contato
entre eles que nasce uma pretensão a uma atividade jurisdicional.


Mas, qual é o
principal instrumento para que essa comunicação seja concretizada de forma
eficaz?


Pode-se dizer que
depende da habilidade do advogado em fazer uso de sua principal ferramenta que
é a palavra. Para isso, foram abordadas de uma forma geral, questões relativas
à linguagem e à comunicação, tendo em vista uma abordagem mais específica
relativa ao processo de comunicação entre o advogado e seu cliente.


1.1 INTRODUÇÃO


O Direito é a
ciência social que está presente no cotidiano da vida das pessoas, ainda que
elas não percebam. Podemos citar como exemplo, o nascimento de uma vida humana,
seja quando faz uma compra em um supermercado, seja o simples ato de pagar seus
impostos, seja quando ocorre um acidente de trânsito, seja quando há uma briga
entre vizinhos, seja na hora da morte de um ente querido. Dependendo do
acontecimento, este será “encaixado” em algum ramo do direito.  Mas, como é possível representar alguém se
você não sabe como transcrever no meio jurídico o que seu cliente quer dizer?


Segundo Návia
Costa, (2018, p.31)

O que não se
compreende não é considerado. A linguagem deve ser utilizada de forma  culta, porém de acesso
democrático, o que, na maioria dos casos, não é praticado no meio forense.

Quer um exemplo
claro de que isso ocorre diariamente? Todos os dias, nos tribunais, algum juiz
pronuncia uma sentença que nem mesmo o acusado consegue entender o que está
sendo dito. O juiz, neste momento, esquece que ele pronuncia uma sentença para
outra pessoa, neste caso, leiga da linguagem forense. É necessário adaptar a
linguagem constantemente, visto que é por meio dela que nos comunicamos.


A ex-ministra
do Supremo Tribunal Federal, Ellen Gracie, relatou certa vez a sua preocupação
com a linguagem forense:


“Que
a sentença seja compreensível a quem apresentou a demanda e se enderece às
partes em litígio. A decisão deve ter caráter esclarecedor e didático.
Destinatário de nosso trabalho é o cidadão jurisdicionado, não as academias
jurídicas as publicações especializadas ou as instâncias superiores. Nada deve
ser mais claro e acessível do que uma decisão judicial bem fundamentada”.

  

Analisando o fato
citado, podemos dizer que o principal instrumento que o advogado utilizará para
se comunicar é a linguagem. A linguagem é o meio pelo qual o advogado mostra
seu conhecimento aos possíveis clientes e caso esta linguagem seja muito
técnica, compreende-se que poderá dificultar a comunicação entre o advogado e
cliente, e este, por sua vez, não tem conhecimento na área jurídica e procura
um representante para solucionar a sua
lide.


Desta forma, os
operadores do Direito, desde o início da sua formação, devem dar uma atenção
especial ao estudo da nossa Língua Portuguesa, para que haja uma contribuição
efetiva no sentido de que o Direito seja um pouco mais acessível a todos.


2. LINGUAGEM JURÍDICA


2.1 TIPOS DE LINGUAGEM

A nossa língua
portuguesa é uma língua muito rica em recursos, talvez resida aí toda a
dificuldade em utilizá-la. Portanto, é conveniente esclarecer o significado de
alguns conceitos que são importantes para o entendimento de como funciona a linguagem.


LINGUAGEM é um
sistema de signos utilizados para estabelecer uma comunicação. A linguagem
humana seria de todos os sistemas de signos o mais complexo. Seu aparecimento e
desenvolvimento devem-se à necessidade de comunicação dos seres humanos. Fruto
de aprendizagem social e reflexo da cultura de uma comunidade, o domínio da
linguagem é relevante na inserção do indivíduo na sociedade.


A LINGUAGEM VERBAL
é uma faculdade que o homem utiliza para exprimir seus estados mentais por meio
de um sistema de sons vocais que denomina-se língua. Esse sistema organiza os
signos e estabelece regras para seu uso. Assim, pode-se afirmar que qualquer
tipo de linguagem desenvolve-se com base no uso de um sistema ou código de
comunicação, a língua. A LINGUAGEM é uma característica humana universal,
enquanto a LÍNGUA é a linguagem particular de uma comunidade, um grupo, um
povo.


SISTEMA é uma
organização que rege a estrutura de uma língua.


LÍNGUA é um
código que permite a comunicação, um sistema de signos e combinações. Ela tem
caráter abstrato e dispõe de um sistema de sons, e concretiza-se por meio de
atos de fala, que são individuais. Assim, enquanto a língua é um conjunto de
potencialidades dos atos de fala, esta (ou discurso) é um ato de concretização
da língua.


A FALA é
anterior à escrita, mas tem, através dos tempos, sido relegada a uma condição
de inferioridade por causa das circunstâncias modernas em que informações e
documentos escritos constituem o mundo das relações humanas e de produção.


As características diferenciadoras entre LÍNGUA e FALA
são: a língua é sistemática, tem certa regularidade, é potencial, coletiva; a
fala é assistemática, nela se observa certa variedade, é concreta, real,
individual.


A NORMA varia
segundo a influência do tempo, espaço geográfico, classe social ou
profissional, nível cultural do falante. A diversidade das normas, visto que há
tantas quanto os indivíduos, não afeta a unidade da língua, que contém a soma
de todas as normas.


A LÍNGUA
PORTUGUESA
, portanto, é um sistema linguístico que abrange o conjunto das
normas que se concretiza por meio dos atos individuais de fala. Ela é um dos
sistemas linguísticos existentes dentro do conceito geral de língua e
compreende variações diversas devidas a locais, fatores históricos e socioculturais
que levam à criação de variados modos de usar a língua.


NORMA é um
conjunto de regras que regulam as relações linguísticas. A norma sofre afrontas
ou é contrariada devido a vários fatores: alterações devidas às classes sociais
diferentes, alterações devidas aos vários indivíduos que utilizam a língua.


3. VOCABULÁRIO JURÍDICO


Mais uma vez,
saber expressar-se no direito é de suma importância. É através das palavras que
o profissional do direito irá formular o pedido do seu cliente, formando o
pensamento através das palavras. Consequentemente, caso não use este recurso a
seu favor e não saiba utilizar as palavras em seu contexto, terá o seu pedido
indeferido, melhor dizendo, o pedido não será aceito, será negado pelo juiz.


Compreende-se que
a palavra e o Direito estão ligados. A palavra é o meio pelo qual o
profissional de Direito realiza várias atividades tais como: peticionar,
contestar, apelar, arrazoar, inquirir, persuadir, provar, tergiversar, julgar,
absolver ou condenar. Sendo assim, o advogado deve ter muito cuidado com os
vocábulos que lida na advocacia.


A semântica é uma
parte da língua que estuda o significado das palavras. Há sutis diferenças
semânticas para os operadores do direito enquanto para pessoas que não são da
área, tem o mesmo significado.  Exemplo
disso é que domicílio, residência e habitação diferem juridicamente entre si,
tal como posse, domínio ou propriedade; observará, ainda, que decadência,
prescrição, preclusão e perempção, embora assemelhadas no sentido, não querem
dizer a mesma coisa.


3.1 NÍVEIS DA LINGUAGEM

 

Um breve
comentário sobre os níveis da linguagem faz-se necessário.


As formas
linguísticas podem sofrer variações, as quais são chamadas de variantes.
Exemplos dessas variantes podem ser língua padrão e língua não-padrão;
linguagem culta ou padrão e linguagem popular ou subpadrão; dentre outros.


Na comunicação
do advogado com seu cliente, podem estar presentes todos esses níveis da
linguagem ao mesmo tempo. Daí a importância do conhecimento do advogado a respeito
da linguagem.


4. A FUNÇÃO DA LINGUAGEM JURÍDICA PARA OS OPERADORES
DO DIREITO

  

O advogado,
mais do que qualquer operador do Direito, deve procurar melhorar seu
vocabulário, procurando utilizar sempre o termo mais adequado a cada situação,
impedindo, assim, que haja entendimentos muito discrepantes do que pretendia
que fosse.


Moreno
e Martins diz que:


“Para
o advogado, entretanto, tudo é linguagem: é esse o
único instrumento de que ele dispõe para tentar convencer,
refutar, atacar ou defender-se. Também é na
linguagem que se concretizam as leis, as petições, as
sentenças ou as mais ínfimas cláusulas de um contrato
– que não passam, no fundo, de normas peculiares
de textos que o advogado terá de redigir ou interpretar.
O profissional do Direito, desse modo, precisa
conhecer os principais recursos do idioma.”


5. COMUNICAÇÃO


5.1 ELEMENTOS DA COMUNICAÇÃO


Os elementos da
comunicação são conhecidos empiricamente por todos, pois, todas as pessoas se comunicam
entre si, querendo ou não. A linguagem é o elo que une todas as matérias que se
relacionam com o Direito.


Para facilitar o
entendimento, há um esquema gráfico que mostra cada elemento da comunicação e a
relação entre eles:

Observa-se
através do esquema, que todo o fenômeno jurídico em qualquer dimensão que possa
vir a ter, esses elementos interagem conjuntamente para formar a estrutura do
pensamento, tornando possível uma perfeita comunicação e sua utilização no
mundo jurídico.


6. CONCLUSÃO


O presente artigo
nasceu da percepção da importância do conhecimento da adequada aplicação da
Língua Portuguesa no âmbito das atividades desenvolvidas pelos profissionais do
Direito. A entrevista com o cliente é um dos momentos mais importantes na vida
do advogado porque é desse primeiro contato que haverá ou não a formação de
todo o caminho a ser seguido no mundo jurídico e o advogado só obtém êxito se
souber utilizar a linguagem e a comunicação jurídica. Da mesma forma, o
advogado só saberá representar seu cliente e argumentar de forma eficaz se
entender a importância da linguagem em sua profissão. Podemos dizer, então, que
a linguagem utilizada pelo advogado em seu argumento, poderá fazê-lo ganhar ou
perder a causa.


REFERÊNCIAS


COSTA, Návia. Comunicação Jurídica – Linguagem, argumentação
e gênero textual 4ª edição 2ª tiragem/ Návia Costa – Leme/ SP: Mundo Jurídico,
2018.


MORENO, Cláudio; MARTINS, Túlio. Português para
convencer: comunicação e persuasão em Direito. São Paulo: Ática, 2006.


Shamara Ferreira é graduanda em Direito pela PUC-GO. 


E-mail para contato é:
shamaraferreira2016@gmail.com.