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É possível requerer reserva de honorários pelo advogado que patrocinou a causa 

11/09/2019 - 10:28


EMENTA


CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES SUSCITADAS QUE FORAM EXAMINADAS. INTERESSE JURÍDICO E INTERESSE ECONÔMICO. CONCEITOS INDIVIDUALIZÁVEIS. INTERESSE JURÍDICO QUE PRESSUPÕE O RISCO DE O PROCESSO AFETAR A EXISTÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DE DIREITO OU OBRIGAÇÃO DE QUEM PRETENDE INTERVIR. REPERCUSSÃO ECONÔMICA. POSSIBILIDADE. FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM EM QUE SE EXERCE ATIVIDADE COGNITIVA COMPLEMENTAR QUE ADMITE, EM TESE, A EXTINÇÃO DO DIREITO AOS HONORÁRIOS CONTRATUAIS DE ÊXITO NA HIPÓTESE DE LIQUIDAÇÃO ZERO. INTERESSE JURÍDICO DO ADVOGADO DESTITUÍDO PRESENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE RESERVA HONORÁRIOS CONTRATUAIS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. POSSIBILIDADE. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. REEXAME DA QUESTÃO RELACIONADA AO DESTACAMENTO DE HONORÁRIOS DESTITUÍDO. LEGITIMIDADE DO ASSISTIDO, MAS NÃO DO ADVERSÁRIO DO ASSISTIDO. RESERVA DOS HONORÁRIOS NO BOJO DO PROCESSO EM QUE ATUOU. ADMISSIBILIDADE QUANDO AUSENTE LITÍGIO COM O EX-CLIENTE, DÚVIDA SOBRE VALOR OU RISCO DE TUMULTO OU FORMAÇÃO DE LIDE PARALELA. AUSÊNCIA DE PROVA. DISSENSO JURISPRUDENCIAL. DESSEMELHANÇA FÁTICA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E OS PARADIGMAS.
1- Recurso especial interposto em 27/07/2017 e atribuído à Relatora em 25/05/2018.
2- Os propósitos recursais consistem em definir, para além da suposta negativa de prestação jurisdicional: (i) se é jurídico o interesse do advogado que foi destituído após patrocinar os interesses do vencedor na fase de conhecimento e que foi admitido no processo ao fundamento de que o resultado da fase de liquidação influenciará a sua relação jurídica com o assistido, pois com ele possui contrato de honorários com cláusula de êxito; (ii) se é recorrível, de imediato e por meio de agravo de instrumento, a decisão interlocutória proferida na fase de liquidação que indefere o ingresso de terceiro na qualidade de assistente simples (iii) se é admissível o debate acerca da reserva de honorários de procurador destituído no âmbito da liquidação de sentença proferida em ação ajuizada pelo assistido em face do devedor.
3- Não é omisso ou obscuro o acórdão que se pronuncia, de forma clara e efetiva, sobre as questões aventadas pela parte.
4- A exata conceituação do interesse jurídico e a sua adequada distanciação do conceito de interesse econômico são questões de acentuada complexidade, pois é difícil estabelecer essa distinção em circunstâncias limítrofes e nas quais as diferenças entre o interesse jurídico e o interesse econômico, embora sabidamente existentes, sejam muito tênues, adotando essa Corte a tese de que o interesse jurídico que permite a assistência surge quando o resultado do processo pode afetar a existência ou inexistência de algum direito ou obrigação daquele que pretende intervir como assistente, sem prejuízo de o interesse jurídico vir acompanhado repercussões econômicas que não possuam o condão de desnaturá-lo.
Precedentes.
5- Considerando que a fase de liquidação de sentença, embora de natureza controvertida, desenvolve-se mediante atividade cognitiva complementar à cognição exercida na fase de conhecimento, pois se limita a apuração do valor da condenação que fora estabelecido genericamente na sentença de mérito, é correto concluir que na liquidação por artigos, agora chamada de liquidação pelo procedimento comum, existe a possibilidade de prejuízo concreto à existência do direito aos honorários de advogado pactuados com cláusula de êxito na hipótese da chamada liquidação zero, que, embora devesse ser rara, vem frequentemente sendo objeto de exame pelo Poder Judiciário.
6- A decisão interlocutória que defere a reserva de honorários contratuais em fase de liquidação de sentença é recorrível de imediato, por agravo de instrumento, em razão da regra contida no art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015. Precedentes.
7- O adversário do assistido não tem legitimidade recursal para provocar o reexame da questão relacionada a reserva dos honorários pactuados entre o assistido e o assistente, na medida em que a referida questão diz respeito a relação jurídica distinta da que originou o processo.
8- É admissível o destacamento dos honorários contratuais por êxito devidos ao patrono destituído, no bojo do processo em que atuou, quando não houver litígio entre ele e o ex-cliente, dúvida sobre o valor, risco de tumulto ou formação de lides paralelas, circunstâncias que não se presumem ou se inferem, mas, ao revés, devem ser provadas.
9- É inadmissível o recurso especial fundado na divergência quando dessemelhantes as premissas fáticas que fundam o acórdão recorrido e os paradigmas.
10- Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido.
(REsp 1798937/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 13/08/2019, DJe 15/08/2019)


INTEIRO TEOR


RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.937 - SP (2018/0120677-0)

RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A
ADVOGADOS : TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM - SP067721
EVARISTO ARAGÃO FERREIRA DOS SANTOS - PR024498
MARIA CLÁUDIA STANSKY E OUTRO(S) - PR042987
RECORRIDO : JOSE REINALDO COSER
RECORRIDO : MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA
ADVOGADOS : JOSÉ REINALDO COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) - SP110923
MÁRCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS - SP118809
INTERES. : KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA
ADVOGADOS : JOEL LUIS THOMAZ BASTOS - SP122443
WELLINGTON DE QUEIROZ - DF010860
RICARDO POMERANC MATSUMOTO E OUTRO(S) - SP174042


EMENTA


CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES SUSCITADAS QUE FORAM EXAMINADAS. INTERESSE JURÍDICO E INTERESSE ECONÔMICO. CONCEITOS INDIVIDUALIZÁVEIS. INTERESSE JURÍDICO QUE PRESSUPÕE O RISCO DE O PROCESSO AFETAR A EXISTÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DE DIREITO OU OBRIGAÇÃO DE QUEM PRETENDE INTERVIR. REPERCUSSÃO ECONÔMICA. POSSIBILIDADE. FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM EM QUE SE EXERCE ATIVIDADE COGNITIVA COMPLEMENTAR QUE ADMITE, EM TESE, A EXTINÇÃO DO DIREITO AOS HONORÁRIOS CONTRATUAIS DE ÊXITO NA HIPÓTESE DE LIQUIDAÇÃO ZERO. INTERESSE JURÍDICO DO ADVOGADO DESTITUÍDO PRESENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE RESERVA HONORÁRIOS CONTRATUAIS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. POSSIBILIDADE. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. REEXAME DA QUESTÃO RELACIONADA AO DESTACAMENTO DE HONORÁRIOS DESTITUÍDO. LEGITIMIDADE DO ASSISTIDO, MAS NÃO DO ADVERSÁRIO DO ASSISTIDO. RESERVA DOS HONORÁRIOS NO BOJO DO PROCESSO EM QUE ATUOU. ADMISSIBILIDADE QUANDO AUSENTE LITÍGIO COM O EX-CLIENTE, DÚVIDA SOBRE VALOR OU RISCO DE TUMULTO OU FORMAÇÃO DE LIDE PARALELA. AUSÊNCIA DE PROVA. DISSENSO JURISPRUDENCIAL. DESSEMELHANÇA FÁTICA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E OS PARADIGMAS.
1- Recurso especial interposto em 27/07/2017 e atribuído à Relatora em 25/05/2018.
2- Os propósitos recursais consistem em definir, para além da suposta negativa de prestação jurisdicional: (i) se é jurídico o interesse do advogado que foi destituído após patrocinar os interesses do vencedor na fase de conhecimento e que foi admitido no processo ao fundamento de que o resultado da fase de liquidação influenciará a sua relação jurídica com o assistido, pois com ele possui contrato de honorários com cláusula de êxito; (ii) se é recorrível, de imediato e por meio de agravo de instrumento, a decisão interlocutória proferida na fase de liquidação que indefere o ingresso de terceiro na qualidade de assistente simples (iii) se é admissível o debate acerca da reserva de honorários de procurador destituído no âmbito da liquidação de sentença proferida em ação ajuizada pelo assistido em face do devedor.
3- Não é omisso ou obscuro o acórdão que se pronuncia, de forma clara e efetiva, sobre as questões aventadas pela parte.
4- A exata conceituação do interesse jurídico e a sua adequada distanciação do conceito de interesse econômico são questões de acentuada complexidade, pois é difícil estabelecer essa distinção em circunstâncias limítrofes e nas quais as diferenças entre o interesse jurídico e o interesse econômico, embora sabidamente existentes, sejam muito tênues, adotando essa Corte a tese de que o interesse jurídico que permite a assistência surge quando o resultado do processo pode afetar a existência ou inexistência de algum direito ou obrigação daquele que pretende intervir como assistente, sem prejuízo de o interesse jurídico vir acompanhado repercussões econômicas que não possuam o condão de desnaturá-lo. Precedentes.
5- Considerando que a fase de liquidação de sentença, embora de natureza controvertida, desenvolve-se mediante atividade cognitiva complementar à cognição exercida na fase de conhecimento, pois se limita a apuração do valor da condenação que fora estabelecido genericamente na sentença de mérito, é correto concluir que na liquidação por artigos, agora chamada de liquidação pelo procedimento comum, existe a possibilidade de prejuízo concreto à existência do direito aos honorários de advogado pactuados com cláusula de êxito na hipótese da chamada liquidação zero, que, embora devesse ser rara, vem frequentemente sendo objeto de exame pelo Poder Judiciário.
6- A decisão interlocutória que defere a reserva de honorários contratuais em fase de liquidação de sentença é recorrível de imediato, por agravo de instrumento, em razão da regra contida no art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015. Precedentes.
7- O adversário do assistido não tem legitimidade recursal para provocar o reexame da questão relacionada a reserva dos honorários pactuados entre o assistido e o assistente, na medida em que a referida questão diz respeito a relação jurídica distinta da que originou o processo.
8- É admissível o destacamento dos honorários contratuais por êxito devidos ao patrono destituído, no bojo do processo em que atuou, quando não houver litígio entre ele e o ex-cliente, dúvida sobre o valor, risco de tumulto ou formação de lides paralelas, circunstâncias que não se presumem ou se inferem, mas, ao revés, devem ser provadas.
9- É inadmissível o recurso especial fundado na divergência quando dessemelhantes as premissas fáticas que fundam o acórdão recorrido e os paradigmas.
10- Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido.


ACÓRDÃO


Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 13 de agosto de 2019(Data do Julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.937 - SP (2018/0120677-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A
ADVOGADOS : TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM - SP067721
EVARISTO ARAGÃO FERREIRA DOS SANTOS - PR024498
MARIA CLÁUDIA STANSKY E OUTRO(S) - PR042987
RECORRIDO : JOSE REINALDO COSER
RECORRIDO : MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA
ADVOGADOS : JOSÉ REINALDO COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) - SP110923
MÁRCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS - SP118809
INTERES. : KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA
ADVOGADOS : JOEL LUIS THOMAZ BASTOS - SP122443
WELLINGTON DE QUEIROZ - DF010860
RICARDO POMERANC MATSUMOTO E OUTRO(S) - SP174042

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

Cuida-se de recurso especial interposto por ITAÚ UNIBANCO S/A, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional, em face de acórdão do TJ/SP que, por unanimidade, conheceu em parte do agravo de instrumento interposto pelos recorridos e, nessa extensão, deu-lhe provimento.
Recurso especial interposto em: 27/07/2017.


Atribuído ao gabinete em: 25/05/2018.


Ação: de revisão de cláusulas contratuais cumulada com revisão de saldo em conta corrente e repetição/compensação de valores, ajuizada pelo interessado KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA. em face do recorrente ITAÚ UNIBANCO S.A.


Decisão interlocutória: indeferiu o pedido de ingresso dos recorridos JOSÉ REINALDO COSER e MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA como assistentes, ao fundamento de que eles, que advogaram para a interessada KVA por um determinado período e com ela firmaram contrato de honorários advocatícios com cláusula de êxito, apenas possuiriam interesse econômico no desfecho da controvérsia (fls. 50/56, e-STJ).


Acórdão: por unanimidade, conheceu parcialmente do agravo de instrumento interposto pelos recorridos e, nessa extensão, deu-lhe provimento, nos termos da seguinte ementa:

Ementa: Mandato. Revogação. Pedido de assistência e de reserva de honorários contratuais, formulado por ex-patronos da autora da demanda. Arguição de irregularidade na representação processual da autora da demanda. Matéria não apreciada na decisão recorrida. Recurso, em parte não conhecida, e na parte conhecida, provido. (fls. 534/541, e-STJ).

Embargos de declaração: opostos pela recorrente, foram desprovidos por unanimidade (fls. 641/647, e-STJ).


Recurso especial: alega-se violação ao art. 1.022 do CPC/2015, ao fundamento de que teria havido obscuridade e omissão não sanadas no acórdão recorrido; violação ao art. 1.015 do CPC/2015, ao fundamento de que não caberia agravo de instrumento na hipótese; violação ao art. 119 do CPC/2015, pois o interesse dos recorridos, alegadamente de cunho econômico, não autorizaria o ingresso como terceiro em processo alheio; violação aos arts. 22, §4º, e 24, §1º, ambos da Lei nº 8.906/94, porque teria sido permitida a introdução de debate sobre questão alheia ao processo, a saber, reserva de honorários de procurador destituído (fls. 544/572, e-STJ).


É o relatório.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.937 - SP (2018/0120677-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A
ADVOGADOS : TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM - SP067721
EVARISTO ARAGÃO FERREIRA DOS SANTOS - PR024498
MARIA CLÁUDIA STANSKY E OUTRO(S) - PR042987
RECORRIDO : JOSE REINALDO COSER
RECORRIDO : MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA
ADVOGADOS : JOSÉ REINALDO COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) - SP110923
MÁRCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS - SP118809
INTERES. : KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA
ADVOGADOS : JOEL LUIS THOMAZ BASTOS - SP122443
WELLINGTON DE QUEIROZ - DF010860
RICARDO POMERANC MATSUMOTO E OUTRO(S) - SP174042


EMENTA


CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. QUESTÕES SUSCITADAS QUE FORAM EXAMINADAS. INTERESSE JURÍDICO E INTERESSE ECONÔMICO. CONCEITOS INDIVIDUALIZÁVEIS. INTERESSE JURÍDICO QUE PRESSUPÕE O RISCO DE O PROCESSO AFETAR A EXISTÊNCIA OU INEXISTÊNCIA DE DIREITO OU OBRIGAÇÃO DE QUEM PRETENDE INTERVIR. REPERCUSSÃO ECONÔMICA. POSSIBILIDADE. FASE DE LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PELO PROCEDIMENTO COMUM EM QUE SE EXERCE ATIVIDADE COGNITIVA COMPLEMENTAR QUE ADMITE, EM TESE, A EXTINÇÃO DO DIREITO AOS HONORÁRIOS CONTRATUAIS DE ÊXITO NA HIPÓTESE DE LIQUIDAÇÃO ZERO. INTERESSE JURÍDICO DO ADVOGADO DESTITUÍDO PRESENTE. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE RESERVA HONORÁRIOS CONTRATUAIS EM LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA. RECORRIBILIDADE IMEDIATA. POSSIBILIDADE. ART. 1.015, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/2015. REEXAME DA QUESTÃO RELACIONADA AO DESTACAMENTO DE HONORÁRIOS DESTITUÍDO. LEGITIMIDADE DO ASSISTIDO, MAS NÃO DO ADVERSÁRIO DO ASSISTIDO. RESERVA DOS HONORÁRIOS NO BOJO DO PROCESSO EM QUE ATUOU. ADMISSIBILIDADE QUANDO AUSENTE LITÍGIO COM O EX-CLIENTE, DÚVIDA SOBRE VALOR OU RISCO DE TUMULTO OU FORMAÇÃO DE LIDE PARALELA. AUSÊNCIA DE PROVA. DISSENSO JURISPRUDENCIAL. DESSEMELHANÇA FÁTICA ENTRE O ACÓRDÃO RECORRIDO E OS PARADIGMAS.
1- Recurso especial interposto em 27/07/2017 e atribuído à Relatora em 25/05/2018.
2- Os propósitos recursais consistem em definir, para além da suposta negativa de prestação jurisdicional: (i) se é jurídico o interesse do advogado que foi destituído após patrocinar os interesses do vencedor na fase de conhecimento e que foi admitido no processo ao fundamento de que o resultado da fase de liquidação influenciará a sua relação jurídica com o assistido, pois com ele possui contrato de honorários com cláusula de êxito; (ii) se é recorrível, de imediato e por meio de agravo de instrumento, a decisão interlocutória proferida na fase de liquidação que indefere o ingresso de terceiro na qualidade de assistente simples (iii) se é admissível o debate acerca da reserva de honorários de procurador destituído no âmbito da liquidação de sentença proferida em ação ajuizada pelo assistido em face do devedor.
3- Não é omisso ou obscuro o acórdão que se pronuncia, de forma clara e efetiva, sobre as questões aventadas pela parte.
4- A exata conceituação do interesse jurídico e a sua adequada distanciação do conceito de interesse econômico são questões de acentuada complexidade, pois é difícil estabelecer essa distinção em circunstâncias limítrofes e nas quais as diferenças entre o interesse jurídico e o interesse econômico, embora sabidamente existentes, sejam muito tênues, adotando essa Corte a tese de que o interesse jurídico que permite a assistência surge quando o resultado do processo pode afetar a existência ou inexistência de algum direito ou obrigação daquele que pretende intervir como assistente, sem prejuízo de o interesse jurídico vir acompanhado repercussões econômicas que não possuam o condão de desnaturá-lo. Precedentes.
5- Considerando que a fase de liquidação de sentença, embora de natureza controvertida, desenvolve-se mediante atividade cognitiva complementar à cognição exercida na fase de conhecimento, pois se limita a apuração do valor da condenação que fora estabelecido genericamente na sentença de mérito, é correto concluir que na liquidação por artigos, agora chamada de liquidação pelo procedimento comum, existe a possibilidade de prejuízo concreto à existência do direito aos honorários de advogado pactuados com cláusula de êxito na hipótese da chamada liquidação zero, que, embora devesse ser rara, vem frequentemente sendo objeto de exame pelo Poder Judiciário.
6- A decisão interlocutória que defere a reserva de honorários contratuais em fase de liquidação de sentença é recorrível de imediato, por agravo de instrumento, em razão da regra contida no art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015. Precedentes.
7- O adversário do assistido não tem legitimidade recursal para provocar o reexame da questão relacionada a reserva dos honorários pactuados entre o assistido e o assistente, na medida em que a referida questão diz respeito a relação jurídica distinta da que originou o processo.
8- É admissível o destacamento dos honorários contratuais por êxito devidos ao patrono destituído, no bojo do processo em que atuou, quando não houver litígio entre ele e o ex-cliente, dúvida sobre o valor, risco de tumulto ou formação de lides paralelas, circunstâncias que não se presumem ou se inferem, mas, ao revés, devem ser provadas.
9- É inadmissível o recurso especial fundado na divergência quando dessemelhantes as premissas fáticas que fundam o acórdão recorrido e os paradigmas.
10- Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido.


RECURSO ESPECIAL Nº 1.798.937 - SP (2018/0120677-0)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A
ADVOGADOS : TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM - SP067721
EVARISTO ARAGÃO FERREIRA DOS SANTOS - PR024498
MARIA CLÁUDIA STANSKY E OUTRO(S) - PR042987
RECORRIDO : JOSE REINALDO COSER
RECORRIDO : MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA
ADVOGADOS : JOSÉ REINALDO COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) - SP110923
MÁRCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS - SP118809
INTERES. : KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA
ADVOGADOS : JOEL LUIS THOMAZ BASTOS - SP122443
WELLINGTON DE QUEIROZ - DF010860
RICARDO POMERANC MATSUMOTO E OUTRO(S) - SP174042

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

Os propósitos recursais consistem em definir, para além da suposta negativa de prestação jurisdicional: (i) se é jurídico o interesse do advogado que foi destituído após patrocinar os interesses do vencedor na fase de conhecimento e que foi admitido no processo ao fundamento de que o resultado da fase de liquidação influenciará a sua relação jurídica com o assistido, pois com ele possui contrato de honorários com cláusula de êxito; (ii) se é recorrível, de imediato e por meio de agravo de instrumento, a decisão interlocutória proferida na fase de liquidação que indefere o ingresso de terceiro na qualidade de assistente simples (iii) se é admissível o debate acerca da reserva de honorários de procurador destituído no âmbito da liquidação de sentença proferida em ação ajuizada pelo assistido em face do devedor.

1. DA NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.022, I E II, DO CPC/2015.


Inicialmente, o recorrente alega que o acórdão recorrido padece de obscuridade e omissão, pois não teria se pronunciado sobre o que seria interesse jurídico de forma reflexa e de que modo ele incidiria na relação jurídica, indicando que, a seu ver, o benefício ou prejuízo da parte seria obviamente econômico.


Ocorre que a questão suscitada pela recorrente foi efetiva e claramente enfrentada pelo acórdão recorrido, que considerou que o resultado da liquidação de sentença possuiria aptidão para influenciar também a relação de direito material mantida entre os recorridos e a interessada KVA (contrato de honorários com cláusula de êxito), de modo que não se pode qualificar como omisso ou obscuro o acórdão que se pronuncia sobre as questões aventadas pela parte.

2. DA AUSÊNCIA DE INTERESSE JURÍDICO QUE JUSTIFIQUE A INTERVENÇÃO DO ADVOGADO DESTITUÍDO COMO ASSISTENTE SIMPLES DO VENCEDOR. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 119 DO CPC/2015.


No ponto, alega o recorrente, em síntese, que o interesse dos recorridos na controvérsia subjacente não seria jurídico, mas, sim, apenas econômico, ao fundamento de que não existiria a categoria do “interesse econômico com reflexo jurídico” em que se baseou o acórdão recorrido.


Assim, diz o recorrente que, na hipótese, o interesse manifestado pelos recorridos seria estritamente econômico, especialmente porque o direito aos honorários advocatícios (contratuais ou sucumbenciais) e o percentual a ser recebido pelos recorridos não sofreriam qualquer modificação em razão da coisa julgada material que se formou.


Nesse particular, anote-se que a exata conceituação do interesse jurídico e a sua adequada distanciação do conceito de interesse econômico são, conforme reconhece a doutrina e a jurisprudência, questões de acentuada complexidade, na medida em que é frequentemente difícil estabelecer essa distinção em circunstâncias limítrofes e nas quais as diferenças entre o interesse jurídico e o interesse econômico, embora sabidamente existentes, sejam muito tênues.


Colhe-se da lição de Fredie Didier Jr. o conceito de interesse jurídico que qualifica a intervenção do terceiro na condição de assistente simples:

Na assistência simples, o terceiro ingressa no feito afirmando-se titular de relação jurídica conexa àquela que está sendo discutida.


O interesse jurídico do terceiro reflete-se na circunstância de manter este, com o assistido, relação jurídica que poderá ser afetada pelo julgamento da causa. O assistente simples visa à vitória do assistido, tendo em vista o reflexo que a decisão possa ter em relação jurídica existente entre eles. É a eficácia reflexa que uma decisão pode ter que justifica a intervenção como assistente simples [...].
Fundamental perceber que, no processo, não se discute relação jurídica da qual faça parte este terceiro, bem como não tem ele qualquer vínculo jurídico com o adversário do assistido. O terceiro intervém para ser parte auxiliar – sujeito parcial, mas que, em razão de o objeto litigioso do processo não lhe dizer respeito diretamente, fica submetido à vontade do assistido. (DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. Vol. 1. 17ª ed. Salvador: Juspodivm, 2015. p. 481).

Por sua vez, a jurisprudência desta Corte fixou a tese, em mais de uma oportunidade, que “o interesse jurídico que permite a assistência (art. 50 do CPC) surge quando o resultado do processo pode afetar a existência ou inexistência de algum direito ou obrigação daquele que pretende intervir como assistente”, ressalvando-se, contudo, que pode “haver casos em que esse interesse jurídico vem acompanhado de alguma repercussão econômica, mas essa circunstância não terá, necessariamente, o condão de desnaturá-lo” (REsp 1.128.789/RJ, 3ª Turma, DJe 01/07/2010). No mesmo sentido: REsp 1.199.940/RJ, 3ª Turma, DJe 04/03/2011 e REsp 1.143.166/RJ, 3ª Turma, DJe 03/11/2011.


Em caráter preliminar, é correto concluir, pois, que o interesse jurídico que justifica a intervenção do terceiro como assistente simples decorre do simples fato de ser possível, em tese, que do processo de que não participou resulte decisão que possa afetar a existência de um direito próprio de que é titular, admitindo-se, inclusive, a existência de repercussões econômicas como decorrência do interesse jurídico.


Assim, embora realmente inexista a figura do “interesse econômico com reflexo jurídico” a que se referiu o acórdão recorrido, há, todavia, a figura do “interesse jurídico com reflexo econômico”, amplamente reconhecida pela jurisprudência desta Corte, devendo ser examinado se a hipótese em exame se enquadra ou não nessa categoria.


Para tanto, é preciso identificar, inicialmente, a natureza jurídica da fase de liquidação da sentença, especialmente porque a tese vertida no recurso especial é de que não haveria absolutamente nenhum risco ao direito aos honorários contratuais e sucumbenciais dos recorridos (seja quanto à existência, seja quanto ao percentual), na medida em que a questão estaria acobertada pela coisa julgada material e, portanto, estariam incólumes a qualquer espécie de alteração nessa fase procedimental.


Nesse particular, afirmam Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery que “a liquidação é ação de conhecimento, de natureza constitutivo-integrativa, pois visa completar o título executivo (judicial ou extrajudicial) com o atributo da liquidez, isto é, com o quantum debeatur...”. (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1.349).


De outro lado, lecionam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero que “a liquidação de sentença é considerada simples incidente processual”, pois “não constitui processo autônomo, mas simples fase, eventualmente necessária para prestação de tutela ressarcitória à parte, destinada a outorgar liquidez à obrigação estampada na sentença condenatória ilíquida”. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo código de processo civil comentado. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 621).


A despeito dessa controvérsia doutrinária, fato incontroverso é que a atividade a ser exercida pelo juiz na liquidação de sentença é cognitiva, ainda que mais restrita do que àquela exercida na fase de conhecimento, pois se limita apenas a apuração do valor da condenação que fora estabelecido genericamente na sentença de mérito.


Isso fica ainda mais evidente na liquidação por artigos, agora chamada de liquidação pelo procedimento comum (arts. 509, II, e 511, ambos do CPC/2015) – exatamente a hipótese deste recurso especial – em que se admite amplo contraditório e exauriente atividade instrutória diante da necessidade de alegação e produção de prova sobre fato novo.


É justamente nessa modalidade que surge a possibilidade da denominada liquidação zero, cuja exata conceituação e admissibilidade se encontram nas precisas lições de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery:

25. Liquidação zero. O juiz pode condenar, na ação de conhecimento, declarando a obrigação de pagar, mas relegar a apuração do quantum para a liquidação da sentença. Na verdade a sentença de conhecimento não é condenatória, mas meramente declaratória [...]. Dada a natureza constitutivo-integrativa da sentença de liquidação, é possível que se encontre valor zero para a obrigação de pagar fixada na sentença dita condenatória, porém, declaratória. Não existe mais a regra do CPC/1939 915, que, no caso de liquidação zero, mandava fazer quantas liquidações fossem necessárias até encontrar-se um quantum. Hoje, só há possibilidade do ajuizamento de uma ação de liquidação. A sentença que declara ser zero o quantum debeatur não ofende a coisa julgada do processo de conhecimento.


26. Liquidação zero. Limites. Somente a liquidação pelo procedimento comum pode resultar negativa, dado que nela se tem de provar fato novo, porque o an debeatur foi fixado na sentença sem grau de extensão (a caracterizar-se pela prova do que deve ser liquidado). A liquidação por arbitramento, porque já se fixou o an debeatur, em extensão máxima indiscutível, por decisão transitada em julgado (CPC 509 §4º), é impossível resultar negativa: o perito terá de, forçosamente, atribuir um valor à condenação já determinada pela sentença de conhecimento transitada em julgado, sob pena de ofender-se a coisa julgada, negando-se vigência ao CPC 509 §4º. (NERY JR., Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 16ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016. p. 1.354).

E não se pode olvidar, nesse particular, o bem lançado alerta que consta em precedente desta Corte:

Essa convivência pacífica entre a regra da vedação ao pedido genérico e a previsão aberta das hipóteses em que se admite postergar a definição relativa ao quantum debeatur tem sido objeto de duras críticas da doutrina, em especial, diante de seu efeito concreto, que finda por converter em regra a exceção (ASSIS, Araken de. Manual da execução. 17ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 334). Dessa deturpação sistêmica decorrem situações em que se conflita o julgamento do mérito proferido e o resultado prático que somente poderá ser obtido após a liquidação do título judicial. Não é por outra razão que o Poder Judiciário tem se deparado frequentemente com casos de liquidação zero, situações que deveriam ser raras, uma vez que, na fase de conhecimento, se verificou a existência de obrigação, somente não se tendo alcançado sua precificação - ao menos no que se refere às liquidações por arbitramento. (REsp 1.549.467/SP, 3ª Turma, DJe 19/09/2016).

A consequência jurídica de uma eventual liquidação zero é, evidentemente, o reconhecimento da inexistência dos direitos e obrigações estipuladas genericamente na sentença de mérito, de modo que as eventuais relações jurídicas vinculadas a esses direitos e obrigações poderão, diferentemente do que sustenta o recorrente, serem igualmente reconhecidos como inexistentes, mesmo após a formação da coisa julgada na fase de conhecimento.


Na hipótese em exame, verifica-se que o interesse alegado pelos recorridos decorre do fato de que o contrato de honorários celebrado com a interessada KVA possui cláusula de êxito, direito substancial que, data venia, poderá, sim, ser impactado em sua própria existência na fase de liquidação da sentença (como igualmente poderia ser na fase de cumprimento de sentença, por exemplo, em virtude de uma hipotética prescrição intercorrente).


Com efeito, em se tratando de sentença de mérito genérica e ilíquida, haverá, ainda, o desenvolvimento de típica atividade de cognição judicial na fase de liquidação (sobretudo na espécie liquidação por artigos, agora denominada liquidação pelo procedimento comum, em que se admite amplo contraditório e profunda atividade instrutória sobre o fato novo que precisa provar), com aptidão para, em tese, fulminar a própria existência da relação jurídica de direito material mantida entre a interessada KVA e os recorridos, da qual há evidente repercussão jurídica e econômica.


Por esses motivos, é preciso reconhecer que os recorridos são terceiros juridicamente interessados para intervir, como assistentes simples do credor, em liquidação de sentença pelo procedimento comum e, consequentemente, que não houve violação ao art. 119 do CPC/2015, ficando prejudicado o exame da pretensão recursal sob a ótica da divergência jurisprudencial, pois, a despeito de suficientemente demonstrada, prevalece o entendimento que consta do acórdão recorrido.

3. DO DESCABIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO QUANTO À RESERVA DE VALORES CONTRATUAIS POR ADVOGADO DESTITUÍDO. ALEGADA VIOLAÇÃO AO ART. 1.015 DO CPC/2015.


No que se refere a aventada violação ao art. 1.015 do CPC/2015, alegada ao fundamento de que o agravo de instrumento não seria cabível na hipótese, é preciso sublinhar, desde logo, que a irresignação do recorrente se limita a eventual impossibilidade de exame imediato da questão relacionada a reserva dos honorários contratuais, até mesmo porque, no que tange ao deferimento da intervenção dos recorridos como assistentes simples (espécie do gênero intervenção de terceiro), há previsão expressa e indiscutível no art. 1.015, IX, do CPC/2015.


Contudo, como amplamente mencionado na fundamentação acima expendida, o processo judicial em que proferida a decisão interlocutória impugnada pelo agravo de instrumento que se alega ser incabível está em fase de liquidação de sentença, de modo que à hipótese se aplica o art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015.


Isso porque, conforme pacífico entendimento desta 3ª Turma, “para as decisões interlocutórias proferidas em fases subsequentes à cognitiva – liquidação e cumprimento de sentença –, no processo de execução e na ação de inventário, o legislador optou conscientemente por um regime recursal distinto, prevendo o art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015, que haverá ampla e irrestrita recorribilidade de todas as decisões interlocutórias, quer seja porque a maioria dessas fases ou processos não se findam por sentença e, consequentemente, não haverá a interposição de futura apelação, quer seja em razão de as decisões interlocutórias proferidas nessas fases ou processos possuírem aptidão para atingir, imediata e severamente, a esfera jurídica das partes, sendo absolutamente irrelevante investigar, nesse contexto, se o conteúdo da decisão interlocutória se amolda ou não às hipóteses previstas no caput e incisos do art. 1.015 do CPC/2015”. (REsp 1.770.992/SP, 3ª Turma, DJe 22/02/2019). Também no mesmo sentido: REsp 1.736.285/MT, 3ª Turma, DJe 24/05/2019; REsp 1.747.035/SE, 3ª Turma, DJe 07/06/2019.

No mesmo sentido, ensina Cássio Scarpinella Bueno:

O parágrafo único do art. 1.015 complementa o rol com a indicação de que também cabe agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação, na fase de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário. Nesses casos, aliás, é bastante que a decisão interlocutória seja proferida naquelas fases ou processos, independentemente de seu conteúdo, para que sua recorribilidade imediata seja reconhecida. (BUENO, Cássio Scarpinella. Manual de direito processual civil: inteiramente estruturado à luz do novo CPC – Lei nº 13.105, de 16-3-2015. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 623).

A justificativa para o tratamento diferenciado para essas específicas fases ou processos é bem sintetizada por Luiz Guilherme Marinoni e Daniel Mitidiero:

Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação, na fase de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário (art. 1.015, parágrafo único, CPC/2015). No primeiro caso, a justificativa do cabimento do agravo está em que inexiste previsão de apelação no procedimento que visa à liquidação. No segundo e no terceiro, a apelação, embora possa ter lugar, não é usual – em outras palavras, não é um ato necessário do procedimento, salvo para nele colocar fim. O quarto caso justifica-se pela necessidade de imediata revisão das decisões interlocutórias em inúmeras situações que envolvem o processo de inventário. (MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. XVI. São Paulo: Thomson Reuters, 2018. p. 213/214).

Na hipótese em exame, tendo sido proferida, em fase de liquidação de sentença, decisão interlocutória determinando a reserva dos honorários contratuais aos recorridos, tem-se que esse pronunciamento judicial é recorrível, de imediato, por agravo de instrumento, de modo que se conclui que o acórdão recorrido não violou o art. 1.015 do CPC/2015, mas, ao revés, aplicou corretamente o seu parágrafo único.

4. DA ALEGADA IMPOSSIBILIDADE DE RESERVA DOS HONORÁRIOS CONTRATUAIS POR ADVOGADO DESTITUÍDO E DA OBRIGATORIEDADE DE AÇÃO AUTÔNOMA PARA ESSE FIM. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 22, §4º, E 24, §1º, AMBOS DA LEI 8.906/94.


A tese veiculada no recurso especial é de que o destacamento do percentual de honorários contratuais devidos pela interessada KVA aos recorridos seria absolutamente inadmissível no âmbito da liquidação da sentença proferida na ação revisional de contrato bancário ajuizada pela interessada em face do recorrente.


Inicialmente, salta aos olhos a manifesta ausência de legitimidade do recorrente para se insurgir sobre capítulo decisório que, na realidade, diz respeito especificamente à interessada KVA.
Com efeito, embora o recorrente possuísse legitimidade para impugnar o próprio pedido de intervenção dos terceiros por ausência de interesse jurídico, não lhe é conferida, igualmente, a legitimidade para provocar o debate sobre a mais adequada interpretação que se deva dar às regras dos arts. 22, §4º, e 24, §1º, da Lei 8.906/94.


Isso porque a alegada incidência dessas regras apenas aos advogados que ainda atuam no processo e a suposição de que ela somente incidirá quando ausente litigiosidade entre as partes são questões que dizem respeito, especificamente, a relação de direito material subjacente mantida entre a interessada KVA e os recorridos, mas não ao recorrente que, na hipótese, pretende, em última análise, pleitear direito alheio em nome próprio sem autorização do ordenamento jurídico, o que lhe é vedado a teor do art. 18 do CPC/2015.


Ainda que se admita, por conjectura, que o recorrente pudesse ter legitimidade para provocar o reexame das referidas questões, fato é que a argumentação tecida nas razões recursais parte da equivocada premissa de que há litígio entre os recorridos e a interessada KVA sobre o percentual a ser destacado, o que justificaria a necessidade de ação autônoma, quando, na verdade, absolutamente nada indica a existência desse suposto litígio que inviabilize o destacamento dos honorários devidos aos advogados destituídos sobre os quais não há controvérsia, o que, a propósito, depõe contra a razoável duração do processo e a economia processual.


É bastante sintomático, para que se confirme a conclusão a que chegou o acórdão recorrido, que não tenha havido sequer a interposição de recurso especial da interessada KVA, a quem o provimento jurisdicional beneficiaria diretamente, e que, apenas timidamente, veio a concordar com as teses recursais em suas contrarrazões de fls. 667/676 (e-STJ).


De outro lado, é preciso considerar o fato de que, na hipótese em exame, o acórdão recorrido, examinando a prova, consignou que “ficou ressalvado na notificação de revogação do mandato que os honorários previstos no contrato serão pagos no êxito e recebimento dos valores demandados nos processos acima destacados”, o que, de um lado, corrobora a ideia de inexistência de litígio na hipótese, e de outro lado, estabelece premissa fática irretorquível nesta Corte por força do óbice contido na Súmula 7/STJ.


É importante destacar, ainda, que a presunção que se pode inferir da hipótese é de que existe concordância de vontades entre os recorridos e a interessada KVA em adimplir a obrigação como avençada, cabendo a prova do fato contrário a quem sustenta existir situação de litígio que inviabiliza o destacamento do percentual no próprio processo, o que não se fez.


Finalmente, também salta aos olhos a nítida dessemelhança fática entre a hipótese em exame e os paradigmas invocados pela recorrente em seu recurso especial.


Em relação ao AgInt no AREsp 991.469/RS, 4ª Turma, DJe 25/05/2017, constata-se que o paradigma versa sobre a impossibilidade de reserva de honorários em situação de belicosidade entre parte, advogado que havia sido suspenso pela OAB e advogado que assumiu a causa, de modo que “havendo a suspensão cautelar do advogado pela OAB e a revogação do mandato a ele outorgado, é necessária ação própria para pleitear direitos como honorários contratuais e indenização pelos honorários sucumbenciais”. Como claramente se percebe, a moldura fática delineada sequer se aproxima da hipótese em exame no presente recurso especial.


De outro lado, no que se refere ao AgInt no AgRg no AREsp 812.524/PR, 3ª Turma, DJe 27/10/2016, a impossibilidade de reserva dos honorários decorreu, novamente, de situação em que havia conflito entre as partes e havia efetiva dúvida acerca do percentual que tocaria aos patronos destituídos.


Daí porque, no paradigma, adotou-se a jurisprudência da Corte no sentido de que “nos casos em que houve a revogação, pelo cliente, do mandato outorgado ao advogado, este não está autorizado a demandar honorários de sucumbência da parte adversa nos próprios autos da execução relativa ao objeto principal do processo”, de modo que, “nessas hipóteses, o antigo patrono deve pleitear eventuais direitos (por exemplo, honorários contratuais e indenização pelos honorários sucumbenciais de que foi privado) em ação autônoma proposta contra o ex-cliente”, hipótese de que, evidentemente, não se trata no presente recurso especial.


Exatamente o mesmo ocorre em relação aos demais paradigmas invocados pela recorrente, cuja moldura fática é sempre distinta, destacando-se, a todo momento, a existência de controvérsia e de disputa entre as partes, de dúvida sobre o valor e de risco de tumulto e de formação de lides paralelas que, data venia, não se verificam na presente hipótese.

5. CONCLUSÃO


Forte nessas razões, CONHEÇO EM PARTE do recurso especial e, nessa extensão, NEGO-LHE PROVIMENTO.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 2018/0120677-0
PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.798.937 / SP

Números Origem: 000226352620148 00026352620148260272 00030560220038260272 00084432220008826027 21779925520168260000 226352620148 30560220038260272 84432220088260272

EM MESA JULGADO: 13/08/2019

Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro MOURA RIBEIRO

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. LINDÔRA MARIA ARAÚJO

Secretário
Bel. WALFLAN TAVARES DE ARAUJO

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : ITAU UNIBANCO S.A
ADVOGADOS : TERESA CELINA DE ARRUDA ALVIM - SP067721
EVARISTO ARAGÃO FERREIRA DOS SANTOS - PR024498
MARIA CLÁUDIA STANSKY E OUTRO(S) - PR042987
RECORRIDO : JOSE REINALDO COSER
RECORRIDO : MARCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA
ADVOGADOS : JOSÉ REINALDO COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) - SP110923
MÁRCIA CRISTINA DE SOUZA NOGUEIRA COSER (EM CAUSA PRÓPRIA) E OUTROS - SP118809
INTERES. : KVA ENGENHARIA ELÉTRICA LTDA
ADVOGADOS : JOEL LUIS THOMAZ BASTOS - SP122443
WELLINGTON DE QUEIROZ - DF010860
RICARDO POMERANC MATSUMOTO E OUTRO(S) - SP174042

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Contratos Bancários

CERTIDÃO


Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso especial e, nesta parte, negou-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.


Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro (Presidente) votaram com a Sra. Ministra Relatora.