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É devida indenização quando houver atraso na entrega da chave do imóvel comprado na planta

12/05/2021 - 08:00

EMENTA


Direito Imobiliário. Compra e venda de imóvel na planta. Atraso na entrega. Cobrança pela ré de taxa de obra/juros/encargos. Ação Indenizatória por danos materiais e morais. Estabelecimento da data final para entrega efetiva das chaves. Condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, de restituição dos valores pagos indevidamente a título de taxa de evolução da obra e dos aluguéis pela autora, correspondente ao período de atraso na entrega das chaves do imóvel. Recursos. Taxa de evolução de obra, por vezes denominada "juros de obra", que se refere aos juros incidentes sobre o saldo devedor de financiamento concedido antes da conclusão das obras de empreendimento imobiliário, durante o período em que não há a previsão de parcelas de amortização da dívida principal. Matéria afetada pelo Superior Tribunal de Justiça, sem suspensão dos processos em curso. REsp 1.729.593/SP de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellize que afetou o rito do art. 1.036 do CPC. Jurisprudência deste Tribunal considera que a taxa de evolução de obra não pode ser cobrada no período de atraso da entrega do bem, já que implica em acréscimos de juros sem que o adquirente tenha concorrido para tal. Ademais, constitui entendimento sedimentado na jurisprudência que sempre que houver atraso na entrega do imóvel ao comprador os danos materiais, na modalidade de lucros cessantes, são presumidos, decorrentes da falta de disponibilidade do imóvel no período. "[...] A jurisprudência desta Corte Superior se consolidou no sentido de que é cabível a condenação ao pagamento de lucros cessantes nos casos de descumprimento do prazo para entrega de imóvel objeto de compromisso de compra e venda, presumindo-se o prejuízo do promitente comprador. [...]" (AgInt no REsp 1825732/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellize, Terceira Turma, julgado em 17/02/2020, DJe 19/02/2020). Ré que deve devolver à autora a taxa de evolução de obra de forma simples a partir de outubro de 2018 à abril de 2019. Dano moral configurado, uma vez que houve atraso na entrega das chaves do imóvel. "Quantum" arbitrado que merece manutenção. Precedentes citados: 0514214-09.2015.8.19.0001 - Apelação - Des. Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto - Julgamento: 10/03/2020 - Décima Sexta Câmara Cível; 0036255-48.2016.8.19.0209 - Apelação - Des. Alcides da Fonseca Neto - Julgamento: 29/04/2020 - Vigésima Quarta Câmara Cível. Desprovimento do primeiro recurso e parcial provimento do segundo. (TJ-RJ - APL: 00084526120198190023, Relator: Des(a). NAGIB SLAIBI FILHO, Data de Julgamento: 29/04/2021, SEXTA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 12/05/2021)


Inteiro Teor

Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro


Sexta Câmara Cível


Apelação Cível nº 0008452-61.2019.8.19.0023


Apelante 1: Almeria Empreendimentos Imobiliários Ltda


Advogado: Doutor Júlio de Carvalho Paula Lima


Apelante 2: Fabiana Elias Paulo


Advogada: Doutora Denise Gomes Siqueira Mendes


Apelado: Os Mesmos


Relator: Desembargador Nagib Slaibi


ACÓRDÃO


Direito Imobiliário. Compra e venda de imóvel na planta. Atraso na entrega. Cobrança pela ré de taxa de obra/juros/encargos. Ação Indenizatória por danos materiais e morais.


Estabelecimento da data final para entrega efetiva das chaves. Condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, de restituição dos valores pagos indevidamente a título de taxa de evolução da obra e dos aluguéis pela autora, correspondente ao período de atraso na entrega das chaves do imóvel. Recursos.


Taxa de evolução de obra, por vezes denominada “juros de obra”, que se refere aos juros incidentes sobre o saldo devedor de financiamento concedido antes da conclusão das obras de empreendimento imobiliário, durante o período em que não há a previsão de parcelas de amortização da dívida principal.


Matéria afetada pelo Superior Tribunal de Justiça, sem suspensão dos processos em curso. REsp 1.729.593/SP de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellize que afetou o rito do art. 1.036 do CPC. Jurisprudência deste Tribunal considera que a taxa


de evolução de obra não pode ser cobrada no período de atraso da entrega do bem, já que implica em acréscimos de juros sem que o adquirente tenha concorrido para tal.


Ademais, constitui entendimento sedimentado na jurisprudência que sempre que houver atraso na entrega do imóvel ao comprador os danos materiais, na modalidade de lucros cessantes, são presumidos, decorrentes da falta de disponibilidade do imóvel no período.


“[...] A jurisprudência desta Corte Superior se consolidou no sentido de que é cabível a condenação ao pagamento de lucros cessantes nos casos de descumprimento do prazo para entrega de imóvel objeto de compromisso de compra e venda, presumindo-se o prejuízo do promitente comprador. [...]” (AgInt no REsp 1825732/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellize, Terceira Turma, julgado em 17/02/2020, DJe 19/02/2020).


Ré que deve devolver à autora a taxa de evolução de obra de forma simples a partir de outubro de 2018 à abril de 2019.


Dano moral configurado, uma vez que houve atraso na entrega das chaves do imóvel. “Quantum” arbitrado que merece manutenção.


Precedentes citados: 0514214-09.2015.8.19.0001 – Apelação – Des. Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto – Julgamento: 10/03/2020 – Décima Sexta Câmara Cível; 0036255-48.2016.8.19.0209 – Apelação – Des. Alcides da Fonseca Neto – Julgamento: 29/04/2020 – Vigésima Quarta Câmara Cível.


Desprovimento do primeiro recurso e parcial provimento do segundo.


ACORDAM os Desembargadores que integram a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por unanimidade, em negar provimento ao primeiro recurso, e dar parcial provimento ao segundo, nos termos do voto do Relator.


Trata-se de ação de reparação por danos morais e materiais c/c


devolução de valores referentes à cobrança indevida de taxa de evolução de obras, proposta por Fabiana Elias Paulo em face de Almeria Empreendimentos Imobiliários Ltda.


Alega que em 14/03/2018, a autora firmou com a ré contrato de "Promessa de Compra e Venda", para aquisição do apartamento na Avenida Flávio Vasconcelos, lote 01, quadra 08, apartamento 202, bloco 11, Bairro Esperança, Itaboraí, R.J., no Empreendimento Condomínio Conquista Itaboraí, com direito a uma vaga de garagem, pelo valor de R$ 125.000,00 (cento e vinte e cinco mil reais), subsidiado pelo Programa Minha Casa Minha Vida, do Governo Federal e financiado pela Caixa Econômica Federal.


Afirma que os pagamentos das parcelas, sempre foram honrados com pontualidade.


Consta das cláusulas do Instrumento Contratual, que a unidade imobiliária, seria entregue pela ré, devidamente construída e com o respectivo "habite-se", até 30/05/2018.


Sustenta que as chaves não foram entregues no prazo contratual, tampouco no prazo de tolerância de 180 dias previstos, que findou-se em 26/11/2018, sendo entregue 11 (onze) meses após o prazo, ou seja, no dia 13/04/2019, causando diversos transtornos, que somente assumiu a dívida pelo fato da ré ter firmado a promessa da entrega no prazo supracitado, vez que já arcava com o valor de um aluguel mensal no valor de R$ 400,00 (quatrocentos reais).


Requereu que a parte ré seja condenada a pagar em dobro as taxas de obra relativas aos meses de dezembro/2018 até abril/2019, que totalizam o valor de R$ 3.177,98 (três mil, cento e setenta e sete reais e noventa e oito centavos), bem como as que por ventura vierem a ser cobradas no decorrer da ação, indenização pelos alugueres pagos pela autora, no valor de R$ 2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais), devidamente acrescidos de correção monetária e juros legais, além do


valor de R$ 25.000,00 (Vinte e cinco mil reais) a título de danos morais.


Sentença de procedência, para condenar a ré ao pagamento de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) a título de dano moral, bem assim, a título de dano material, de valor de aluguel pago pela autora, correspondente ao período de atraso na entrega das chaves do imóvel, desde o término do prazo de tolerância até a efetiva entrega (outubro de 2018 a abril de 2019).


Apelação da construtora afirmando inexistir o atraso alegado uma vez que a autora não demonstrou o suposto atraso.


Afirma que a emissão do habite-se pelos órgãos públicos, não passa pelo juízo de intervenção da apelante, de forma que ela não detém nenhum poder sobre os atos praticados pelos órgãos públicos, não podendo, portanto, ser responsabilizada por tais.


Alega inexistir os danos morais, uma vez que não há comprovação de relação locatícia, uma vez que os recibos juntados, não demonstram vínculo com algum contrato de locação, assim como inexiste ato ilícito de configurar qualquer dano à apelada.


Apelação da parte autora, sustentando o cabimento da apelação para reforma da sentença quanto ao pagamento em dobro das taxas de evolução de obra.


Contrarrazões da construtora se reportando as teses apresentadas em sua apelação.


Contrarrazões da autora requerendo a manutenção da sentença em relação aos danos morais, e a indenização dos valores pagos a título de aluguéis.


É o relatório.


Recurso conhecido, uma vez presentes os requisitos para a sua admissibilidade.


Cinge-se a controvérsia em verificar se a empresa ré deve ser


condenada ao pagamento de taxa de evolução de obra, danos morais, aluguel correspondente ao período de atraso na entrega das chaves do imóvel.


A questão em julgamento deve ser analisada à luz das normas do Código de Proteçâo e Defesa do Consumidor, pela existência de relação consumerista entre as partes, sendo assim objetiva a responsabilidade do fornecedor, adotando a Lei consumerista a Teoria do Risco do Empreendimento, a menos que demonstre alguma das excludentes previstas no § 3º do art. 14 da Lei nº 8.078/1990.


Não obstante, a primeira apelante foi a destinatária dos pagamentos efetuados a título de aquisição da unidade imobiliária, sendo a responsável pelo atraso da entrega das chaves do imóvel.


Compulsando-se os autos verifica-se que, em 14/03/2018, as partes firmaram contrato de promessa de compra e venda do imóvel em questão (fls. 20/31), as chaves não foram entregues no prazo contratual de nove meses, conforme Cláusula Quarta, item 4.1, tampouco no prazo de tolerância de 180 dias previstos, no item 4.2, que findou-se em 26/11/2018, sendo entregue 11 (onze) meses após o prazo, 13/04/2019, fl. 102.


Incontroverso, portanto, o atraso na entrega, eis que o próprio réu afirmam em seu recurso que tal fato ocorreu, conforme afirmação da entrega ter sido no dia 13/04/2019, fl. 102.


Desta maneira, correta a sentença ao declarar como data da efetiva entrega das chaves do imóvel o dia 13/04/2019.


Constitui entendimento sedimentado na jurisprudência que sempre que houver atraso na entrega do imóvel ao comprador os danos materiais, na modalidade de lucros cessantes, são presumidos, decorrentes da falta de disponibilidade do imóvel no período.


Sobre o tema, o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:


AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. ATRASO NA ENTREGA DO IMÓVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. 1.


ANÁLISE DE OFENSA A NORMA CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE. 2. LUCROS CESSANTES. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO. PREJUÍZO PRESUMIDO. PRECEDENTE. 3. DANOS MORAIS. OCORRÊNCIA. PARTICULARIDADES DO CASO CONCRETO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 4. MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO CPC/2015. NÃO INCIDÊNCIA, NA ESPÉCIE. 5. AGRAVO IMPROVIDO.


1. Inviável a análise de ofensa aos dispositivos constitucionais, ainda que para fins de prequestionamento, sob pena de usurpação da competência reservada à Corte Suprema.


2. A jurisprudência desta Corte Superior se consolidou no sentido de que é cabível a condenação ao pagamento de lucros cessantes nos casos de descumprimento do prazo para entrega de imóvel objeto de compromisso de compra e venda, presumindo-se o prejuízo do promitente comprador.


3. O Tribunal estadual, com base nas peculiaridades do caso, entendeu que a demora na entrega do imóvel ultrapassou o mero aborrecimento ao gerar insegurança e desequilíbrio psíquico aos adquirentes - conclusão cuja revisão esbarra no óbice do verbete sumular n. 7/STJ.


4. O mero não conhecimento ou improcedência de recurso interno não enseja a automática condenação na multa do art. 1.021, § 4º, do NCPC, devendo ser analisado caso a caso.


5. Agravo interno a que se nega provimento.


(AgInt no REsp 1825732/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 17/02/2020, DJe 19/02/2020).


Os lucros cessantes são devidos, pois a demora na entrega das chaves privou a parte autora da fruição do bem pelo período que a ré, ilegitimamente, subtraiu-lhes a posse do imóvel, havendo, indubitavelmente, lucros cessantes em seu favor, conforme entendimento da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.


Nesse sentido:


Apelação Cível. Imobiliário. Autores que adquiriram imóvel “na planta” por meio do Programa Minha Casa Minha Vida. Contrato


que previa a conclusão das obras em novembro de 2010. Expedição do “habite-se” em abril de 2013. Pedidos de indenização por lucros cessantes, danos emergentes consistentes na “taxa de obra” e danos morais. Sentença de parcial procedência que determinou a restituição dos valores pagos a título de juros e correção monetária durante o período de atraso e o pagamento de R$5.000,00 a título de danos morais para cada um dos autores. Apelo das rés. 1- Autores que incluíram no polo passivo a pessoa jurídica que figurou no contrato de compra e venda como entidade organizadora e construtora do empreendimento, mas também outras duas construtoras, sem apontar a sua pertinência subjetiva. Rés que alegam sua ilegitimidade passiva, por terem sido contratadas pela Prefeitura para realizar obras e não terem qualquer relação direta com os adquirentes. 2- Taxa de evolução de obra, por vezes denominada “juros de obra”, que se refere aos juros incidentes sobre o saldo devedor de financiamento concedido antes da conclusão das obras de empreendimento imobiliário, durante o período em que não há a previsão de parcelas de amortização da dívida principal. Encargos que são devidos pelos autores também durante a fase de amortização, sendo pagos à Caixa Econômica Federal, e não à incorporadora. 3- Questão aparentemente idêntica que foi apreciada pelo STJ ao julgar o REsp 1.729.593, sob o regime dos recursos representativos de controvérsia, firmando-se a seguinte tese: “É ilícito cobrar do adquirente juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância”. 4- Tese que deve ser aplicada à luz dos fundamentos do acórdão do STJ. Incorporadora que é responsável, em verdade, pelo dano material correspondente à diferença verificada no cálculo dos juros em função da ausência de amortização do saldo devedor por um período maior do que o contratualmente previsto. 5- Jurisprudência firme do STJ que admite a ocorrência de danos morais em hipóteses de atraso na entrega das chaves de imóvel adquirido em fase de construção, sempre que houver


consequência fática capaz de acarretar o abalo indenizável. 6Ausência de controvérsia quanto ao atraso de mais de dois anos na entrega das chaves do imóvel. Indenização que não se mostra excessiva ante o tempo decorrido, a situação de incerteza experimentada e o fato de que se tratava da primeira aquisição de imóvel próprio. 7- Recurso parcialmente provido para excluir do polo passivo a MRV e a MRL e ressalvar que a incorporadora deverá pagar o valor correspondente à diferença verificada no cálculo dos juros de obra durante o período de atraso. (051421409.2015.8.19.0001 – Apelação – Des. Eduardo Gusmão Alves de Brito Neto – Julgamento: 10/03/2020 – Décima Sexta Câmara Cível).


Com relação à devolução da “taxa de evolução de obra”, necessário esclarecer que tal taxa por vezes denominada “juros de obra”, se refere aos juros incidentes sobre o saldo devedor de financiamento concedido antes da conclusão das obras de empreendimento imobiliário, durante o período em que não há a previsão de parcelas de amortização da dívida principal.


O pagamento dos referidos juros compensatórios deriva do contrato de financiamento para a aquisição de unidade habitacional e são pagos durante a fase de construção do empreendimento e, decorrido o interregno para a entrega das chaves, não pode o promissário comprador ser responsabilizado pela sua quitação. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação nº 0001934-22.2018.8.19.0207, Rel. Des. Juarez Fernandes Folhes, DJo:11/03/2020, Décima Câmara Cível).


Sobre tal tema o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Repetitivo consolidou:


RECURSO ESPECIAL CONTRA ACÓRDÃO PROFERIDO EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. ART. 1.036 DO CPC/2015 C/C O ART. 256-H DO RISTJ. PROCESSAMENTO SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS. PROGRAMA MINHA CASA, MINHA VIDA. CRÉDITO ASSOCIATIVO. PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL EM


CONSTRUÇÃO. CONTROVÉRSIAS ENVOLVENDO OS EFEITOS DO ATRASO NA ENTREGA DO BEM. RECURSOS DESPROVIDOS.


1. As teses a serem firmadas, para efeito do art. 1.036 do CPC/2015, em contrato de promessa de compra e venda de imóvel em construção, no âmbito do Programa Minha Casa, Minha Vida, para os beneficiários das faixas de renda 1,5, 2 e 3, são as seguintes:


1.1 Na aquisição de unidades autônomas em construção, o contrato deverá estabelecer, de forma clara, expressa e inteligível, o prazo certo para a entrega do imóvel, o qual não poderá estar vinculado à concessão do financiamento, ou a nenhum outro negócio jurídico, exceto o acréscimo do prazo de tolerância.


1.2 No caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluído o período de tolerância, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, a ensejar o pagamento de indenização, na forma de aluguel mensal, com base no valor locatício de imóvel assemelhado, com termo final na data da disponibilização da posse direta ao adquirente da unidade autônoma.


1.3 É ilícito cobrar do adquirente juros de obra ou outro encargo equivalente, após o prazo ajustado no contrato para a entrega das chaves da unidade autônoma, incluído o período de tolerância.


1.4 O descumprimento do prazo de entrega do imóvel, computado o período de tolerância, faz cessar a incidência de correção monetária sobre o saldo devedor com base em indexador setorial, que reflete o custo da construção civil, o qual deverá ser substituído pelo IPCA, salvo quando este último for mais gravoso ao consumidor.


2. Recursos especiais desprovidos.


(REsp 1729593/SP, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 25/09/2019, DJe 27/09/2019).


Observe-se que a injustificada demora na conclusão da obra e na entrega das chaves do imóvel acarreta maior soma devida à Caixa


Econômica Federal, o que não pode ser imputado ao consumidor, ora segunda apelante.


Desta maneira, verifica-se que, apesar da ré não receber as quantias relativas à taxa de evolução de obra, o atraso na entrega do imóvel gera para elas a responsabilidade pelo ressarcimento dos juros da obra direcionados à instituição financeira, tendo em vista que os pagamentos se prolongaram no tempo por culpa das apelantes.


Assim deve a primeira apelante devolver à segunda apelante a taxa de evolução de obra de forma simples a partir de outubro de 2018 à abril de 2019.


Nesse sentido:


APELAÇÃO CÍVEL. RELAÇÃO DE CONSUMO. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS AJUIZADA EM FACE DE MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A. ALEGAM OS AUTORES QUE ADQUIRIRAM IMÓVEL DA RÉ, COM PREVISÃO DE ENTREGA EM JANEIRO DE 2014, CONSIDERANDO O PRAZO DE TOLERÂNCIA, TENDO O IMÓVEL SIDO ENTREGUE EM MARÇO DE 2015. ADUZEM QUE PAGARAM TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRAS APÓS JULHO DE 2013. REQUEREM: (A) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DE R$ 20.000,00 PARA CADA AUTOR; (B) RESSARCIMENTO EM DOBRO DA TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRAS A PARTIR DE JULHO DE 2013; (C) RESSARCIMENTO EM DOBRO DA COMISSÃO DE CORRETAGEM. SENTENÇA JULGANDO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS. CONDENAÇÃO: (A) AO PAGAMENTO DE R$ 8.000,00 PARA CADA AUTOR A TÍTULO DE DANOS MORAIS; (B) À RESTITUIÇÃO, NA FORMA SIMPLES, DA TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRA A PARTIR DE FEVEREIRO DE 2014. IMPROCEDÊNCIA DOS DEMAIS PEDIDOS. APELAÇÃO DA RÉ. REQUER A IMPROCEDÊNCIA. ALTERNATIVAMENTE, A REDUÇÃO DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SENTENÇA QUE NÃO MERECE REFORMA. ATRASO INCONTROVERSO. AS CIRCUNSTÂNCIAS DE INÉRCIA DOS FORNECEDORES DA RÉ E CONDIÇÕES CLIMÁTICAS ADVERSAS CONFIGURAM FORTUITO INTERNO, INAPTAS PARA ELIDIR A FALHA NA PRESTAÇÃO DO


SERVIÇO. TEORIA DO RISCO DO EMPREENDIMENTO. DANOS MORAIS IN RE IPSA. QUANTUM ARBITRADO COM RAZOABILIDADE, JÁ CONSIDERANDO OS QUATORZE MESES QUE OS AUTORES FICARAM PRIVADOS DE USUFRUIR DO BEM. INTELIGÊNCIA DA SÚMULA Nº 343 DESTA CORTE. QUANTO À TAXA EVOLUÇÃO DE OBRA, ESSA MATÉRIA FOI AFETADA PELO STJ, SEM SUSPENSÃO DOS PROCESSOS EM CURSO. RECURSO ESPECIAL AFETADO AO RITO DO ART. 1.036 CPC/2015. (RESP 1.729.593/SP, REL. MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, JULGADO EM 11/09/2018, DJE 18/09/2018). OCORRE QUE A JURISPRUDÊNCIA DESTE TRIBUNAL CONSIDERA QUE A TAXA DE EVOLUÇÃO DE OBRAS NÃO PODE SER COBRADA NO PERÍODO DE ATRASO DA ENTREGA DO BEM, JÁ QUE IMPLICA EM ACRÉSCIMOS DE JUROS SEM QUE O ADQUIRENTE TENHA CONCORRIDO PARA TAL. RÉ QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DOS ART. 373, II, DO CPC, E 14, § 3º, DO CDC. NÃO PROVIMENTO DA APELAÇÃO. “Ação Indenizatória por danos morais e materiais pelo procedimento comum” ajuizada por Leonardo Bandeira Silva e Ítala Almeida da Silva em face de MRV Engenharia e Participações S/A. Alegam os autores que firmaram contrato de aquisição de imóvel e, apesar de janeiro de 2014 ser o mês limite para entrega, já considerando o prazo de tolerância de 180 dias, as chaves foram entregues em 03/03/2015. Aduzem que a ré cobrou indevidamente taxa de obras de julho de 2013 até janeiro de 2015, no valor total de R$ 5.661,08. Requerem: (a) indenização por danos morais de R$ 20.000,00 para cada autor; (b) o ressarcimento em dobro do valor referente à taxa de evolução de obras a partir de julho de 2013; (c) o ressarcimento em dobro do valor da comissão de corretagem. Sentença julgando parcialmente procedente o pedido. Condenação: (a) ao pagamento de R$ 8.000,00 de dano moral a cada autor; (b) à restituição dos valores pagos a título de taxa de evolução de obra a partir de fevereiro de 2014. Improcedência dos demais pedidos. Apelação da ré. Requer a improcedência. Alternativamente, a redução do quantum indenizatório por danos morais. Sentença


que não merece reforma. Relação de consumo. Em 05/06/2011 as partes firmaram instrumento particular de promessa de compra e venda do imóvel em questão em 03/2013, prevalecendo o prazo de 21 meses após a assinatura do contrato junto ao agente financeiro. A cláusula quinta do contrato de promessa de compra e venda estabeleceu tolerância de 180 dias. Inexiste abusividade na referida tolerância, eis que avençada voluntariamente entre as partes, não havendo prova de qualquer vício no negócio jurídico, tido como válido, portanto, nos termos do art. 104 do Código Civil, sendo, inclusive, razoável sua estipulação, levando em conta a natureza e a complexidade presentes na construção civil. Ademais, a possibilidade de carência em favor do fornecedor está positivada no artigo 48, § 2º, da Lei 4.591/1964. Desta forma, como a assinatura do contrato de financiamento junto à CEF ocorreu em 28/10/2011, considerando-se os 21 meses posteriores e o prazo de 180 dias de prorrogação, ter-se-ia como plausível o prazo final de janeiro de 2014 para a entrega da unidade. Incontroverso, portanto, o atraso na entrega, eis que os próprios réus afirmam que o atraso seria não a partir de janeiro de 2014, mas sim a partir de abril de 2014, com base no contrato de financiamento assinado com a CEF, que prevê, no item “B4”, que o prazo para o término da construção seria de 24 meses. Ainda que tal previsão tivesse o poder de prevalecer sobre o avençado entre as partes no contrato particular de promessa de compra e venda, o que não é o caso, esses três meses de diferença seriam insuficientes para desconstituir o incontestável atraso na entrega das chaves. A justificativa apresentada pela ré, diga-se de passagem, não comprovada, no sentido de que o atraso na entrega do imóvel decorreu de inércia dos seus fornecedores e de condições climáticas adversas, é afeta ao risco do empreendimento, configurando fortuito interno, incapaz de eximir a demandada da responsabilidade pelo ressarcimento dos danos decorrentes da falha na prestação do serviço, caracterizada pelo atraso na entrega da unidade imobiliária. Patente a ilicitude da conduta da


ré, uma vez que comprovados o evento, o nexo causal e o dano, impõe-se a obrigação de indenizar, nos termos do art. 14 do CDC. Dano moral in re ipsa, não podendo ser minimizado pela definição de mero aborrecimento. Configurado o dano moral, importante ressaltar que a fixação do quantum devido a este título deve atender aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade, sopesando o magistrado o dano sofrido, bem como as condições econômicas da vítima e do ofensor, não podendo atribuir indenização módica ou indenização exagerada, que ocasione o enriquecimento sem causa do ofendido. Nesse contexto, levando se em conta a angústia dos autores em ver a entrega do seu imóvel postergada por pelo menos quatorze meses (já computado o atraso de 180 dias previsto no contrato), além dos compreensíveis transtornos decorrentes do infortúnio, já que viram frustrada a justa expectativa de usufruir do bem adquirido, vê-se que o valor a título de dano moral no patamar de R$ 8.000,00 (oito mil reais) para cada autor demonstra ser condizente com os critérios acima mencionados e adequado à situação fática narrada, eis que em consonância com o entendimento jurisprudencial atualmente aplicado nesta Corte em hipóteses similares. Ademais, tal montante deve ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade. Neste sentido a Súmula n.º 343 do TJRJ. No tocante ao pedido de devolução do pagamento de taxa de evolução de obra, em que pese a afetação do tema, sem suspensão dos processos em curso (RESP 1.729.593/SP, REL. MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, SEGUNDA SEÇÃO, JULGADO EM 11/09/2018, DJE 18/09/2018), verifica-se que, apesar de a construtora não receber as quantias relativas à taxa de evolução de obra, o atraso na entrega do imóvel gera para ela a responsabilidade pelo ressarcimento dos juros da obra direcionados à instituição financeira, tendo em vista que os pagamentos se prolongaram no tempo por culpa da ora apelante. Desta forma, foi corretamente determinada a devolução da Taxa de Evolução da Obra (também conhecida como "juros no


pé" ou juros compensatórios) a partir da mora da ré, já que transfere para o consumidor o risco do negócio. O injustificado retardo na conclusão do empreendimento, que acarreta maior soma devida à CEF, não pode ser imputado aos consumidores. “ (...). Devolução da taxa de obra que se impõe. Solidariedade entre todos os integrantes da cadeia de consumo, que atuam como parceiros comerciais (...)”. (APL. 0028652- 65.2014. 8.19.0023. Rel. Des. Luiz Fernando de Andrade Pinto. Julg. em 09/09/2015. Precedentes jurisprudenciais do STJ e desta Corte. NÃO PROVIMENTO DA APELAÇÃO. (0001934-22.2018.8.19.0207 – Apelação - Des. Juarez Fernandes Folhes – Julgamento: 11/03/2020 - Décima Câmara Cível).


Patente a ilicitude da conduta da ré, uma vez que comprovados o evento, o nexo causal e o dano, impõe-se a obrigação de indenizar, uma vez que a ré não se desincumbiu do seu ônus de provar fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito da autora, nos termos do art. 373, II, do CPC, ou, de acordo com o § 3º do art. 14 do CDC.


O dano moral é in re ipsa, e não deve ser minimizado pela definição de mero aborrecimento, que foi em muito extrapolado no caso em questão. A propósito, salienta o eminente civilista Sergio Cavalieri Filho que o dano moral se configura pela “... dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústias e desequilíbrio em seu bem-estar”. (CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 14ª edição, São Paulo: Editora Atlas, 2020, p. 86).


Configurado o dano moral, importante ressaltar que a fixação do quantum devido a este título deve atender aos princípios de razoabilidade e proporcionalidade, sopesando o Magistrado o dano sofrido, bem como as condições econômicas da vítima e do ofensor, não podendo atribuir indenização módica ou indenização exagerada, que ocasione o enriquecimento sem causa do ofendido.


Nesse contexto, levando-se em conta a angústia da autora e as


peculiaridades do caso já mencionadas, vê-se que o valor a título de dano moral no patamar de R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais) está adequado, assim como a restituição dos aluguéis pagos pela segunda apelante pelo período do término do prazo de tolerância da entrega das chaves até a efetiva entrega (outubro de 2018 a abril de 2019).


Assim, tendo em vista que, na sentença, condenou-se as partes ao pagamento das custas e honorários advocatícios em 10 % sobre o valor da condenação.


Diante da sucumbência do primeiro apelante, majora-se o valor para mais 2% (dois por cento), com base no previsto no § 11º do art. 85 do CPC.


Ante tais considerações, o voto é no sentido de negar provimento ao primeiro recurso, majorando-se os honorários advocatícios para 12%, consoante disposto no art. 85, § 11 do CPC, e dar parcial provimento ao recurso da parte autora, para que a ré devolva a taxa de evolução de obra a partir de outubro de 2018 a abril de 2019 de forma simples.


Rio de Janeiro, 29 de abril de 2021.


Nagib Slaibi, Relator