Fumaça no ambiente de trabalho e a responsabilidade civil do empregador
Nos últimos anos as tabacarias, hookans e similares
tem ganhado destaque entre o público jovem, de olho nessa tendência muitos
empresários tem investido nesse tipo de negócio. Há uma grande variedade de
charutos e essências para narguilés nesse mercado, além disso, a possibilidade
de compartilhar o equipamento garante maior socialização entre o grupo.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS),
os adeptos do cigarro normalmente terminam de fumar entre cinco e sete minutos,
enquanto uma sessão de narguilé dura de 20 a 80 minutos. A fumaça gerada por
esse tipo de equipamento passa por um filtro de água antes de ser inalada por
uma mangueira, isso pode passar a impressão de que o consumo é inofensivo, mas
especialistas alertam a possibilidade desta prática gerar sérios problemas de
saúde.
O pneumologista e professor da UNB, Carlos Alberto
Viegas, alerta que a água do narguilé absorve 5% das substâncias químicas da
fumaça e o restante é inalado, sendo que o risco é intensificado quando se
substitui o líquido por bebidas alcoólicas. Se o risco à saúde do público que
frequenta estes estabelecidos já é elevado, muito mais é o dos funcionários que
laboram neste meio ambiente de trabalho altamente insalubre.
De acordo com a médica pneumologista Lícia Stanzani,
80% dos casos de tabagismo passivo ocorrem em casa ou no ambiente de trabalho,
e dependendo do tempo de exposição à fumaça, um dia de trabalho pode equivaler
ao fumo de até dez cigarros. A exposição ao agente insalubre vai depender do
tempo em que a pessoa esteve exposta e também da intensidade, quanto mais
pessoas fumando em um ambiente fechado, maior a exposição para o não fumante.
Considerando que em regra a jornada diária de
trabalho é de oito horas, os funcionários que trabalham neste tipo de
estabelecimento estão constantemente expostos à fumaça produzida por cigarros,
charutos, narguilés e similares. É notório todos os males decorrentes do
consumo de cigarros sobre a saúde das pessoas, seja do próprio fumante, seja
das pessoas que são expostas à inalação da fumaça pela proximidade, os chamados
“fumantes passivos”.
Quando se analisa a prática do fumo em ambientes
total ou parcialmente fechados, inclusive os locais de trabalho, vem à tona a
questão do tabagismo passivo,
dado que o não fumante acaba por inalar não apenas a fumaça que emana do tabaco
queimado como também aquela já absorvida e depois expelida pelo fumante.
O Instituto Nacional de Câncer (Inca) define
tabagismo passivo como “a inalação da fumaça de derivados do tabaco (cigarro,
charuto, cigarrilhas, cachimbo e outros produtores de fumaça) por indivíduos
não fumantes, que convivem com fumantes em ambientes fechados”, fumaça esta que
é denominada poluição tabagística
ambiental (PTA).
O tabagismo passivo seria, segundo a mesma fonte, a terceira maior
causa de morte evitável no mundo, depois do tabagismo ativo e do consumo
excessivo de álcool, posto que “o ar poluído contém, em média, três vezes mais
nicotina, três vezes mais monóxido de carbono, e até cinquenta vezes mais
substâncias cancerígenas do que a fumaça que entra pela boca do fumante depois
de passar pelo filtro do cigarro”.
O trabalhador é, portanto, a principal vítima da poluição tabagística ambiental (PTA)
e o maior candidato aos malefícios do tabagismo passivo por se expor por maior
tempo à inalação da fumaça dos derivados do tabaco, sendo que sequer tem a
opção de estar em outro ambiente por força do contrato de trabalho.
Dentre os direitos fundamentais do trabalhador está
a proteção à vida e à integridade física, que começa pela preservação do meio
ambiente de trabalho, sendo obrigação do empregador assegurar aos trabalhadores
o desenvolvimento de suas atividades em um ambiente laboral em conformidade com
as normas de saúde, higiene e segurança do trabalho (art. 7º, inc. XXII, da
CF/88).
A NR-9 do Ministério do Trabalho e Emprego que criou
o PPRA – Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, caracteriza riscos
ambientais como “os agentes físicos, químicos e biológicos existentes nos
ambientes de trabalho que, em função de sua natureza, concentração ou
intensidade e tempo de exposição, são capazes de causar danos à saúde do
trabalhador”, arrolando dentre os agentes químicos os fumos, no sentido genérico de fumaça
de qualquer espécie, não apenas a originada da queima do tabaco.
No caso do empregado exposto de forma contínua e
prolongada à inalação da fumaça de derivados do tabaco, caracterizando assim, o tabagismo passivo na definição
do Inca, há de se concluir que esse fumante passivo pode contrair as mesmas
enfermidades que acometem o fumante ativo. E como a aquisição, desencadeamento
ou agravamento da(s) enfermidade(s) resulta das condições laborativas, forçoso
concluir-se também pela caracterização de doença ocupacional para todos os efeitos legais, devendo o
empregador ser responsabilizado pelo risco da atividade exercida.
A proteção à saúde
física e mental do empregado é dever do empregador que assume os riscos da
atividade econômica. Portanto, tratando-se de uma empresa que explora
atividades recreativas com o uso do tabaco, há de se implementar a adoção de
medidas preventivas tais como a redução da carga horária, a instituição de
repousos especiais durante a jornada de trabalho, principalmente quando a
medição do nível de contaminação do ambiente por monóxido de carbono (CO)
atingisse o limite tolerável de partículas por milhão, bem como o pagamento de
adicional de insalubridade pela exposição aos agentes insalubres, sem prejuízo
da responsabilidade civil do empregador em caso de adoecimento do empregado em
razão do trabalho.
Escrito por Bruna de Sá Araújo, advogada
no escritório Lara Martins Advogados, Vice Coordenadora do Núcleo de Direito do
Trabalho do IEAD, especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho
pelo IPOG e pela UFG, e-mail para contato bruna.sa.araujo@gmail.com,
@desabruna.
Fonte: http://www.institutoead.org/