Tributação das Startups no Brasil


Estudos realizados pelo Sebrae Nacional revelam que cinquenta por cento das empresas no Brasil quebram antes dos dois anos de atividade. Dentre outras questões como a falta de planejamento do empresário e a gestão deficiente, a elevada carga tributária brasileira é apontada como um dos principais obstáculos ao desenvolvimento das empresas.
Nesse cenário, a escolha do regime tributário adequado é estratégia crucial de sobrevivência de qualquer empresa. O regime tributário de uma empresa é o conjunto de leis que vai determinar todos os tributos que ela deve recolher e como eles serão pagos. No geral, a empresa poderá fazer a escolha do seu regime, desde que obedecidos, para tanto, os critérios legais.
Existem três regimes tradicionais no Brasil: o Simples Nacional, o Lucro Real e o Lucro Presumido, que se diferenciam, dentre outros aspectos, pelo limite de faturamento da empresa. Isso significa que, em meio a uma série de questões que precisam ser analisadas para a escolha do melhor regime, a observação do valor do faturamento anual da empresa é uma das mais importantes.
E quando essa empresa trabalha com uma estrutura extremamente enxuta de custos e um modelo de negócio muito incerto, que pode nem ter faturamento inicial? Como fazer para que essa empresa não entre nas estatísticas de morte súbita nos primeiros dois anos de funcionamento?
Estamos falando das startups, o novo modelo de empresa que tem chacoalhado o cenário econômico e social de tal maneira que muitos países já se preocupam em regulamentar e facilitar sua instituição e seu funcionamento.
E o Brasil não ficou atrás nessa regulamentação. Em 24 de abril de 2019 foi sancionada a Lei Complementar 167/2019, que promoveu alterações no Simples Nacional e instituiu o Inova Simples, um regime de tributação simplificado concebido especialmente para as starturps brasileiras.
Mas antes de entender como funciona essa novidade legislativa e quais são os impactos desse novo regime tributário, precisamos alinhar o conceito de startups.
A terminologia startups surgiu na década de 70, tendo sido incorporada, posteriormente, ao dicionário da Universidade de Oxford. Todavia, o uso dessa expressão disparou a partir da década de 90, com o avanço da tecnologia. O conceito clássico é dado por Eric Riés, em seu livro Lean Startup: Uma startup é uma instituição humana desenhada para criar um novo produto ou serviço em condições de extrema incerteza.
Para facilitar a compreensão: com o avanço tecnológico, começaram a surgir muito rapidamente vários negócios disruptivos, ou seja, que jamais existiram anteriormente e que modificaram completamente a estrutura social. É o caso das redes sociais, do Youtube, Netflix, Spotify, Uber, Easytaxi, etc. Todavia, embora esses negócios sejam comuns para nós hoje em dia, quando eles surgiram ninguém sabia ao certo como iriam funcionar e se a sociedade ia comprar esses produtos e serviços, ou seja, surgiram e se desenvolveram em condições de extrema incerteza!
Felizmente, o legislador brasileiro percebeu o quanto esses negócios inovadores impactam na sociedade, na economia e nos cofres públicos, e tratou de instituir o Inova Simples para incentivar a criação de negócios inovadores que, por estarem em condições de incerteza quando ao seu sucesso, precisam de uma tributação específica e simplificada que não inviabilize o surgimento do novo negócio.
A nova lei tem como principal objetivo proporcionar um ambiente mais dinâmico e fácil para a formalização desses novos empreendimentos, diminuindo a burocracia e concedendo alguns benefícios no que diz respeito ao pagamento dos tributos.
Mas como funciona o Inova Simples e como saber se minha empresa pode ser beneficiada por essa nova lei?
Primeiramente, a lei apresenta um conceito do que será considerado startup para o regime de tributação do Inova Simples, o primeiro conceito legal de startups no Brasil, que consta no artigo 65-A, § 1º:
Para os fins dessa Lei Complementar, considera-se startup a empresa de caráter inovador que visa aperfeiçoar sistemas, métodos ou modelos de negócio, de produção de serviços ou de produtos, os quais, quando já existentes, caracterizam startups de natureza incremental, ou, quando relacionados à criação de algo totalmente novo, caracterizam startups de natureza disruptiva.
Percebe-se que como ponto central deste conceito o quesito inovação atrelado ao modelo de negócio de uma startup, seja ela para incrementar, ou seja, melhorar um método, sistema ou negócio, ou de caráter disruptivo algo que até então nunca existiu.
E quais são os benefícios em optar pelo regime tributário Inova Simples?
O tratamento diferenciado para a criação, formalização e desenvolvimento das startups é um dos benefícios concedidos pela Lei Complementar. Por exemplo: para abrir uma empresa sob o regime do Inova Simples, basta cadastrar a empresa na REDESIM (Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização e Empresas e Negócios). Esta plataforma é utilizada para dar andamento a processos de abertura, alteração e extinção de empresas, e agiliza o rito para formalização das empresas. Uma vez preenchido o formulário contendo informações relativas à fatura da startup, o CNPJ da empresa já será gerado automaticamente.
Outros benefícios concedidos são semelhantes aos benefícios que os optantes pelos Simples já podem aproveitar, como alíquotas reduzidas, simplificação na apuração e no pagamento de tributos, simplificação na entrega das declarações e acesso a algumas linhas de crédito especiais.
A lei prevê ainda a facilidade para fazer o registro da marca, obrigando o Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) a registrar marcas e patentes, protegendo as ideias inovadoras das startups.
E, por fim, o ponto mais crucial no que tange à escolha de um regime tributário: qual é o limite de faturamento para enquadramento da empresa no Inova Simples?
O mais adequado não é se falar em limite de faturamento, e sim em limite para a comercialização experimental. A comercialização experimental faz parte da fase de validação do novo modelo de negócio: tem-se a ideia e, antes de se investir muito dinheiro no novo produto ou serviço, eles são comercializados a título de teste para ver se há aceitação por parte do consumidor final.
A LC 167/2019 prevê que o limite para comercialização experimental é de 81 mil reais, mas ainda não se sabe ao certo como será tributada essa receita proveniente da fase de validação, ficando a cargo do Comitê Gestor do Simples a tributação ou não do faturamento da comercialização experimental.
Como último conselho amigo para os corajosos empreendedores que têm a inovação como DNA do seu modelo de negócio, importante observar: embora o regime do Inova Simples seja bem recente e ainda necessite de mais regulamentação a curto prazo, pode valer muito a pena começar sua startup optando por ele, ainda que isso ainda represente alguma incerteza jurídica. Mas não se esqueça: converse com seu contador e seu advogado de confiança para tomar a melhor decisão!
Camilla Pinheiro é advogada, sócia e head inovação do escritório Gomes, Oliveira & Pinheiro, em Goiânia. Pós-graduada em Direito Tributário, especialista em Direito Digital e Direito das Startups. Coordenadora do Núcleo de Inovação e Gestão Jurídica do Instituto de Estudos Avançados em Direito e idealizadora do Law Business Game, o primeiro reality show de empreendedorismo jurídico do Brasil. Membro da ALA Associação Internacional de Administradores Legais (Estados Unidos). Professora, pós-graduada em Docência no Ensino Superior. MBA em Planejamento e Gestão de Escritórios de Advocacia. Professional & Self Coach, Leader Coach e Analista Comportamental.